Leigos e leigas no protagonismo da evangelização
Dom Milton Kenan Junior
A expressão não é nova, ela surge na Conferência de Santo Domingo (1992): “Que todos os leigos sejam protagonistas da Nova Evangelização, da promoção humana e da cultura cristã.” (n.97) (…) “Um laicato, bem-estruturado com formação permanente, maduro e comprometido, é o sinal de Igrejas Particulares que têm tomado muito a sério o compromisso da Nova Evangelização.” (n.103).
Hoje, talvez, precisássemos recuperar a intuição que o Episcopado Latino-americano assumiu, na Conferência de Santo Domingo, quando fala do “protagonismo dos leigos”; embora na Conferência de Aparecida essa expressão não apareça nenhuma vez. Falar de protagonismo, é falar do lugar de importância que os leigos têm na ação evangelizadora, é falar do seu papel insubstituível, imprescindível, na transformação da realidade que vivemos, marcada pela exclusão e pela violência.
Os leigos são protagonistas, afirmaram os bispos em Santo Domingo, ou seja, são os agentes principais no esforço da Igreja em dialogar com o mundo e apresentar os valores do Evangelho num tempo de tantos contra-valores.
Nesse sentido, o Documento de Aparecida e agora o das Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja do Brasil, DGAE 2011-2015, ressaltam dois princípios de grande valor e importância.
O primeiro princípio é o da corresponsabilidade. Leigos e Leigas devem participar, como sujeitos, com vez e voz, na elaboração dos programas pastorais, nos centros de discussão e decisão nas Igrejas Particulares. Referindo-se ao projeto pastoral da Diocese, o Documento de Aparecida afirma: “Os leigos devem participar do discernimento, da tomada de decisões, do planejamento e da execução.” (n.371). Não podem, portanto, verem reduzida a sua participação apenas ao momento de encaminhar e realizar os programas, mas sentirem-se participantes desde o início, por força da sua condição de cristão batizado, habilitado pelos sacramentos do Batismo e da Confirmação, a participar plenamente da vida da Igreja.
É ainda o Documento de Aparecida que esclarece: “A evangelização do Continente, dizia-nos o papa João Paulo II, não pode realizar-se hoje sem a colaboração dos fiéis leigos. Hão de ser parte ativa e criativa na elaboração e execução de projetos pastorais a favor da comunidade. Isso exige, da parte dos pastores, maior abertura de mentalidade para que entendam e acolham o “ser” e o “fazer” do leigo na Igreja, que por seu batismo e sua confirmação é discípulo e missionário de Jesus Cristo.” (n.213).
As DGAE 2011-2015 ressaltam: “Os leigos, corresponsáveis com o ministério ordenado, atuando nessas assembleias, conselhos e comissões, tornam-se cada vez mais envolvidos no planejamento, na execução e na avaliação de tudo que a comunidade vive e faz.” (n.104.c).
O segundo princípio é o da missão. Os Documentos do Episcopado Latino-americano afirmam exaustivamente que o campo específico da ação dos leigos e leigas é o das realidades onde vivem e trabalham, ou seja, é o mundo da família, do trabalho, da cultura, da política, do lazer, da arte, da comunicação, da universidade etc.
Em função disso, “a formação dos leigos e leigas deve contribuir, antes de mais nada, para sua atuação como discípulos missionários no mundo, na perspectiva do diálogo e da transformação da sociedade. É urgente uma formação específica para que possam ter incidência significativa nos diferentes campos, sobretudo ‘no vasto mundo da política, da realidade social e da economia, como também da cultura, das ciências e das artes, da vida internacional, dos meios de comunicação e de outras realidades abertas à evangelização’ (EN 70).” (DAp 283).
As DGAE 2011-2015 incentivam a participação social e política dos cristãos leigos e leigas nos diversos níveis e instituições, nos Conselhos de Direitos, em campanhas e outras iniciativas que busquem efetivar a convivência pacífica, no fortalecimento da sociedade civil, e de controle social. Destaca também a participação na busca de políticas públicas que ofereçam as condições necessárias ao bem-estar de pessoas, famílias e povos; e a formação de pensadores e pessoas que estejam nos níveis de decisão evangelizando com especial atenção e empenho. (cf. n.115-117).
Entre os diversos espaços em que a presença dos leigos e leigas, hoje, é imprescindível destacam-se: o mundo universitário, o mundo da comunicação, e a presença pastoral junto dos políticos e formadores de opinião no mundo do trabalho, dirigentes sindicais e comunitários (n.117).
Há, portanto, no pensamento dos bispos latino-americanos e brasileiros uma condição e uma exigência para o protagonismo dos leigos. A condição é de que leigos e leigas possam ocupar o lugar que lhes cabe na vida das comunidades, sentindo-se, de fato, como sujeitos corresponsáveis na elaboração e realização de projetos e programas de evangelização. E a exigência é a sua atuação evangélica nas realidades onde vivem e atuam, para que à semelhança do fermento possam levedar toda realidade humana com a força do Evangelho.
Este é o grande desafio que hoje não só leigos e leigas enfrentam, mas todo o corpo eclesial: superar o conceito de leigo como inferior, subalterno e destinatário da ação evangelizadora; e formar leigos e leigas para que possam, nas realidades que lhe são específicas, agir como agentes eclesiais, discípulos missionários de Jesus Cristo.
Ao falar do protagonismo dos leigos é indispensável falar de verdadeira conversão pastoral, como é proposta pelo Documento de Aparecida, no espírito da comunhão e libertação (cf. n.368), ultrapassando uma pastoral de mera conversão para uma pastoral decididamente missionária (n.370).
Oxalá leigos e leigas possam exercer seu protagonismo na vida de nossas comunidades eclesiais e assumirem com renovado entusiasmo sua missão nas realidades onde, na sua maioria e na maior parte do seu tempo, estão. Isso exige coragem! O Espírito de Deus certamente não lhes faltará!