Juventude e bioética
Dra. Cláudia Maria de Castro Batista, do Instituto de Biociências da UFRJ, faz palestra no Seminário Nacional de Juventude e Bioética promovido pelas Comissões Episcopais Pastorais para Vida e Família e para a Juventude, da CNBB. O evento será realizado esta semana, de 13 a 15 de julho, em Brasília e é mais um passo de preparação para a Jornada Mundial da Juventude de 2013.
De acordo com o comitê organizador as principais publicações de apoio, aprofundamento e formação em bioética sugeridos para os temas que o seminário abordará são: Questões de Bioética, Estudos da CNBB n. 98, Edições da CNBB; A Dignidade da Vida Humana e as Biotecnologias, Brasília: Edições da CNBB, 2005.
A Agência de notícias ZENIT entrevistou uma das especialistas que estará na mesa de palestrantes do evento, a professora-adjunta da Universidade do Rio de Janeiro (UFRJ), Dra. Cláudia Maria de Castro Batista, pós doutorado na Universidade de Toronto.
Publicamos a entrevista feita pela Agência ZENIT:
ZENIT: Por que a senhora está num seminário de bioética? Qual é a sua relação com a área? Qual será a sua contribuição nesse seminário?
Dra. Claudia: Fui convidada pala Dra. Lenise Garcia que também participará deste Seminário. Desde o julgamento da ADIN contra a Lei de Biossegurança aprovada em 2005 comecei a me interessar pela área. Nesta época acabava de retornar ao país após um postdoc na Universidade de Toronto (onde me especializei em biologia das células tronco) e o então Procurador Geral da República, Dr. Claudio Fonteles convidou-me para participar do debate público no STF sobre as pesquisas com células tronco embrionárias humanas.
Minha contribuição nesse seminário seria propiciar o debate que envolve o avanço da Ciência e a proposta de novas técnicas na área da Biotecnologia que devem se conciliar com o fato de que a vida humana é um direito fundamental. Pretendo mostrar um pouco o atual estado da arte nas Pesquisas com Células Tronco, o seu objeto de estudo e a importância na Medicina Regenerativa, e fazer uma rápida análise bioética sobre a manipulação celular, de gametas e embriões humanos nestas pesquisas que se levam a cabo.
ZENIT: Esse seminário está destinado a qual público?
Dra. Claudia: Está voltado para o público em geral mas especialmente aos jovens e líderes como preparação para a Jornada Mundial da Juventude em 2013.
ZENIT: Alguém que não tem formação médica tem capacidade para entender as questões bioéticas?
Dra. Claudia: Sim. Acredito que um bioeticista tem que ter uma boa formação antropológica, filosófica e estar interado das questões biomédicas quanto à ética nas pesquisas e aos procedimentos em pacientes que, como seres humanos, devem respeitar e valorizar cada pessoa humana como um todo.
ZENIT: Na sua opinião, quais são os principais problemas que a bioética afronta no Brasil?
Dra. Claudia: Em termos de Ciência e Biotecnologia, aqui chegam os problemas já enfrentados no resto do mundo, principalmente a pesquisa envolvendo embriões humanos e as técnicas de fertilização assistida. No campo da saúde pública há ainda toda uma escola com princípios onde o ético seria “o bem comum social”, valorizando o coletivo acima do pessoal, o que leva a inúmeros erros, ou ainda uma ética utilitarista onde tudo se justifica em favor do coletivo.
ZENIT: A bioética é algo propriamente e exclusivamente da Igreja Católica? É algo só do dogma católico, que diz que é proibido matar, discriminar… ou é algo humano, racional?
Dra. Claudia: Não é algo católico nem criado por católicos. O termo Bioética começou a ser usado amplamente a partir do livro lançado em 1971, “Bioética: Ponte para o Futuro”, do biólogo e oncologista americano Van R. Potter. Nasceu da necessidade de se deslocar a discussão acerca dos novos problemas impostos pelo desenvolvimento tecnológico, de um viés mais tecnicista para um caminho mais pautado pelo humanismo, superando a dicotomia entre os fatos explicáveis pela ciência e os valores estudáveis pela ética.
ZENIT: Por que devemos respeitar o embrião humano?
Dra. Claudia: Penso que há um consenso quando se pensa que se deve respeitar todo e qualquer ser humano a partir do primeiro momento da sua existência. A discussão hoje é questionar que momento é este, embora a embriologia tenha desde o século XIX demonstrado com muita segurança o momento da fecundação como o marco para o início do desenvolvimento de um novo indivíduo da espécie humana. É importante ressaltar que esta questão nunca havia sido levantada até que se começou o congelamento de embriões em clínicas de fertilização assistida. Estes embriões, criados com a única finalidade de procriação, foram sendo acumulados e, na procura de um destino para eles, aventou-se a possibilidade de utilizá-los para pesquisas. O embrião humano nunca foi e nunca será um material biológico trivial.
ZENIT: Algumas pessoas acusam os católicos de se preocuparem muito com as vidas delas, com os “seus” úteros, com os “seus” filhos, etc. Realmente a Igreja católica tem o interesse de “infernizar” as pessoas com os seus dogmas e doutrinas? Ou toda reflexão bioética é para um melhor desenvolvimento e progresso da sociedade?
Dra. Claudia: O valor da vida humana é um valor universal, não depende do tempo nem da cultura de um grupo social. A reflexão bioética se faz necessária quando, por exemplo, não está claro para legisladores e cientistas, que o progresso da ciência em si não justifica qualquer procedimento, mesmo que este traga benefícios futuros para a coletividade. É fundamental ter como princípio o benefício também para o embrião, uma vez que este é primeiramente um ser humano e não apenas material biológico.
ZENIT: Há hospitais no Brasil que “fabricam” o filho que a pessoa quiser ter, com a cor dos olhos, da pele, o sexo, etc… porém, fazem isso à custa da morte de vários embriões. Se o embrião é um bebê no estágio inicial, não será uma monstruosidade o que fazem nesses hospitais?
Dra. Claudia: Daí a absoluta necessidade de formar a opinião pública no sentido de reconhecer que não há outros marcos no desenvolvimento além do momento da fecundação. Qualquer outro evento apontado é aleatório. Por exemplo, o aparecimento do sistema nervoso. Não existe um momento ou evento único que marque o aparecimento do sistema nervoso ou do cérebro. Para que o primórdio deste surja são necessárias no mínimo duas semanas. Portanto, respeita-se a vida humana a partir da fecundação ou não a respeitaremos nunca.