Onde está nossa felicidade?
Cardeal Odilo Pedro Scherer
O final do Ano Litúrgico nos coloca diante das “realidades últimas” da nossa existência: para onde conduz a nossa vida? O que vem depois da vida neste mundo? Ainda haverá algo depois da morte?
No Ano da Fé, recordamos os grandes “mistérios da fé”, que Deus manifestou e nos quais cremos, junto com a Igreja. A fé é uma luz divina, que nos faz ver mais longe e compreender mais profundamente toda realidade – também aquilo que incomoda tanto o ser humano que pensa e se interroga sobre o sentido da vida e da morte, sobre a base de sustentação do bem e da justiça, da liberdade humana e do anseio por plenitude e a saciedade para seus anseios e aspirações mais profundas.
No 33º Domingo do Tempo Comum, a Liturgia nos apresentou textos iluminadores da Palavra de Deus, que são resposta a muitas de nossas interrogações. Vale a pena respeitar a Deus, ser honestos e praticar o bem? Ainda mais: vale a pena praticar o bem, mesmo com sofrimento? Esta sempre foi um angustiosa questão para o homem, sobretudo ao ver que os “ímpios” não respeitam ao homem, nem a Deus, e vão bem na vida e até debocham de quem é honesto e reto em seu viver…
A resposta vem do profeta Malaquias: a sorte final de ímpios e justos não será a mesma; a justiça de Deus pode tardar, mas não falhará e colocará cada coisa no seu devido lugar. Os ímpios, como palha, serão queimados e não restará deles nem raiz; mas os justos podem ter a certeza: sobre eles se levantará o sol da justiça e lhes trará salvação (cf Ml 3,19s).
Nossa Profissão de Fé católica afirma: “e de novo (Jesus) há de vir para julgar os vivos e os mortos, e o seu reino não terá fim”. Na compreensão cristã da vida, nós não somos a última instância a decidir sobre o bem e o mal; nem tudo se resolve neste mundo, nem do jeito que cada um decide. Teremos que prestar contas a Deus sobre nossa vida e nosso agir, sobre o uso que tivermos feito de nossa liberdade.
Aliás, na visão da nossa fé, as coisas deste mundo não são ainda a realidade definitiva e final. Nem precisa ter muita fé para afirmar isso: nós passamos e as realidades deste mundo também passam; somos parte de uma realidade boa, mas ainda precária. Por isso, nossa fé nos leva a procurar os “bens eternos” e a “cidade definitiva”, onde Deus será tudo em todos.
Quando Jesus passeia no templo e os apóstolos lhe chamam a atenção para a grandiosidade e a beleza do templo de Salomão, ele responde: “disso tudo não ficará pedra sobre pedra, mas tudo será destruído” (cf.Lucas, 21,9). E convida os apóstolos a perseverarem, firmes na fé e na prática do bem, mesmo em meio a perseguições e injúrias (Lc 21,7,19). Se tivéssemos fé apenas para resolver questões deste mundo, seríamos os mais dignos de compaixão de todos os homens, no dizer de São Paulo. A fé firme em Deus e a esperança que brota da fé, dão-nos coragem e força para a perseverança na prática do bem. A falta de fé dá origem ao imediatismo e à pretensão de ter tudo, já neste mundo.
Na Oração do Dia do 33º Domingo comum, nós pedimos a Deus: “nossa alegria consista em vos servir de todo o coração, pois só teremos felicidade completa, servindo a vós, o criador de todas as coisas” Esta oração, de fato, corresponde ao primeiro mandamento da Lei de Deus: “amar e servir a Deus de todo coração, com todas as forças…” Fora de Deus, não há felicidade plena.
Nossa fé, portanto, tem uma resposta para a questão angustiante do sentido da vida neste mundo e para a questão não menos angustiante do valor da prática do bem: há vida plena e felicidade completa para o homem, contanto que não se afaste de Deus e dos seus caminhos.