A Igreja, perita em humanidade
Pe Almir Magalhaes
O título desta contribuição, “A Igreja, perita em humanidade”, é uma nomenclatura que já se tornou um patrimônio da linguagem eclesial e eclesiástica, e a sua fonte é a Carta Encíclica do Papa Paulo VI – Populorum Progressio (sobre o Desenvolvimento do Povos de 26.03.67, nº. 13) e repetida incontáveis vezes em outros documentos do Magistério e quer significar, em função da sua missão, todo o empenho de se por a serviço de cada homem e do mundo inteiro (Cf. O Esplendor da Verdade, João Paulo II, 06.08.1993, nº. 3).
Colocando o foco das atenções na vida pastoral da Igreja, a preocupação e a prática deste horizonte, levariam a uma reviravolta no modo de compreender a nossa presença junto às pessoas, o nosso modo de julgá-las, às vezes até condenando-as. Esta reviravolta deveria ser uma motivação fundamental para entendermos a missão como encontro, buscando as pessoas lá onde elas se encontram, ajudando a superar uma forma evangelizadora massiva e criando a possibilidade de testemunho, de discipulado.
É interessante como todos os últimos documentos da Igreja de cunho pastoral têm refletido sobre o Ministério do Acolhimento. Isto não seria nenhum favor da nossa parte, se levarmos em conta toda a proximidade de Jesus Cristo junto às pessoas, especialmente os marginalizados e sofredores e acima de tudo aquilo que forma o eixo da sua vida que foi expresso na imagem do BOM PASTOR; ao mesmo tempo é curioso como, em todos os níveis da Igreja e dos mais variados ministérios, esta orientação, que é uma forma de expressar a Igreja como perita em humanidade, é timidamente acolhida.
Tenho defendido peremptoriamente que as Paróquias e Áreas Pastorais elaborem seus Planos de Pastorais, definindo objetivos e prioridades, em função da inculturação do Evangelho e como forma de inserção na realidade. Entretanto, de nada adianta belos planos para serem engavetados ou se não estiverem inspirados na mística do acolhimento, na ternura, no carinho, na atenção às pessoas, como afirma São Paulo – acima de tudo o amor (cf. 1ª Cor 13).
Durante nossas liturgias, sobretudo a Eucarística, temos presenciado em algumas Igrejas esta preocupação louvável de acolher bem as pessoas. Aqui vale a célebre frase “A Igreja faz a Eucaristia e a Eucaristia faz a Igreja”, ou seja, ao administrar a Eucaristia, esta deveria inspirar a vida eclesial de acordo com tudo aquilo que ela representa, o que se celebra. Explicitando melhor, se na liturgia Eucarística há este empenho de acolhimento, isto deveria ser ou a expressão da experiência vivida na comunidade eclesial ou, caso contrário, que se construa aquilo que se constitui em ministérios dentro da mesma: os vários ministérios que se exercem na Eucaristia, incluindo aí o acolhimento deveriam deixar de ser uma “cena” uma “virtualidade cúltica, de aparência no templo” para ser uma realidade, vida.
As estruturas eclesiásticas deveriam ser construídas com base neste pressuposto. Neste caso, a Secretária (Secretaria Paroquial) deveria ser bem preparada para acolher bem as pessoas; os serviços de atendimento das várias pastorais da mesma forma, desde o momento das inscrições de batismo, crisma, matrimônio e outros, e em todas as ocasiões de relações no cotidiano da vida da Igreja .
Ter uma postura de cortesia e atenção às pessoas atrai muito. Neste sentido as normas, as prescrições criadas por nós (e que são muitas) e aquelas constantes do Direito Canônico e do Catecismo da Igreja Católica não seriam relativizadas, mas a relação entre os protagonistas seria na base do diálogo. A partir do que está exposto, vamos entender que missão não significa fazer muitas coisas, ela não se situa no âmbito da atividade, mas naquele das relações. Novas relações fundamentadas na misericórdia, no perdão e na justiça. Quanto mais aproximação mais eleva o nível do discipulado. As Lei, as Normas são valorizados, mas, antes disto o acolhimento.
Tudo na vida de Jesus aponta para estruturas leves e relacionais, para a cura das feridas e o perdão dos pecados. “Às vítimas da rejeição e do desprezo, declara: “bem-aventurados vós, os pobres (Lc 6,20), fazendo-lhes inclusive, sentir e viver, já, uma experiência de libertação, estando com eles, partilhando a mesma mesa (cf. Lc 5,30; 15,2), tratando-os como iguais e amigos (cf. Lc 7, 34), procurando que se sentissem amados por Deus, e revelando, deste modo, imensa ternura pelos necessitados e pecadores (cf. Lc 15, 1-32)” (ver Redemptoris Missio de João Paulo II, nº. 14).
Sempre partilho com os alunos em sala de aula, sobretudo dirigindo-me àqueles que no futuro serão padres, que nós temos uma dificuldade enorme de renovar as nossas estruturas paroquiais e quando o assunto é abordado sempre surgem as reflexões dos limites que temos, dificuldade de mudar por conta dos próprios paroquianos que estão apegados a uma catequese que receberam e colocam obstáculos para mudanças. Tenho dito que nos últimos anos muitas iniciativas nas paróquias foram assumidas, todas elas reforçando um estilo de conservação, rotina e manutenção (missas para todos os gostos, terço dos homens, louvores e mais louvores), que não levam ao fundamental, que seria criar fraternidade, acolhimento, ambiente familiar e uma mentalidade de que a Igreja é PERITA EM HUMANIDADE. Nós “não sabemos” como começar, e, por incrível que pareça a criatividade vai para outra direção.
Pergunto: Qual o sentido de tanta reza, tantas missas, tantos terços, tantos louvores… se tudo isto não conduz a uma espiritualidade do discipulado, a nos tornarmos mais humanos?