A mídia comercial em guerra contra Lula e Dilma

Leonardo Boff

Sou profundamente pela liberdade de expressão em nome da qual fui punido com o “silêncio obsequioso” pelas autoridades do Vaticano. Sob risco de ser preso e torturado, ajudei a editora Vozes a publicar corajosamente o “Brasil Nunca Mais”, onde se denunciavam as torturas, usando exclusivamente fontes militares, o que acelerou a queda do regime autoritário.

Esta história de vida me avaliza fazer as críticas que ora faço ao atual enfrentamento entre o Presidente Lula e a midia comercial que reclama ser tolhida em sua liberdade. O que está ocorrendo já não é um enfrentamento de ideias e de interpretações e o uso legítimo da liberdade da imprensa. Está havendo um abuso da liberdade de imprensa que, na previsão de uma derrota eleitoral, decidiu mover uma guerra acirrada contra o Presidente Lula e a candidata Dilma Rousseff. Nessa guerra vale tudo: o factóide, a ocultação de fatos, a distorção e a mentira direta.

Precisamos dar o nome a esta mídia comercial. São famílias que, quando veem seus interesses comerciais e ideológicos contrariados, se comportam como “famiglia” mafiosa. São donos privados que pretendem falar para todo Brasil e manter sob tutela a assim chamada opinião pública. São os donos de O Estado de São Paulo, de A Folha de São Paulo, de O Globo, da revista Veja, na qual se instalou a razão cínica e o que há de mais falso e chulo da imprensa brasileira. Estes estão a serviço de um bloco histórico assentado sobre o capital que sempre explorou o povo e que não aceita um Presidente que vem desse povo. Mais que informar e fornecer material para a discusão pública, pois essa é a missão da imprensa, esta mídia empresarial se comporta como um feroz partido de oposição.

Na sua fúria, quais desesperados e inapelavelmente derrotados, seus donos, editorialistas e analistas não têm o mínimo respeito devido a mais alta autoridade do país, ao Presidente Lula. Nele veem apenas um peão a ser tratado com o chicote da palavra que humilha.

Mas há um fato que eles não conseguem digerir em seu estômago elitista. Custa-lhes aceitar que um operário, nordestino, sobrevivente da grande tribulação dos filhos da pobreza, chegasse a ser Presidente. Este lugar, a Presidência, assim pensam, cabe a eles, os ilustrados, os articulados com o mundo, embora não consigam se livrar do complexo de vira-latas, pois se sentem meramente menores e associados ao grande jogo mundial. Para eles, o lugar do peão é na fábrica produzindo.

Como o mostrou o grande historiador José Honório Rodrigues (Conciliação e Reforma), “a maioria dominante, conservadora ou liberal, foi sempre alienada, antiprogresssita, antinacional e não contemporânea. A liderança nunca se reconciliou com o povo. Nunca viu nele uma criatura de Deus, nunca o reconheceu, pois gostaria que ele fosse o que não é. Nunca viu suas virtudes, nem admirou seus serviços ao país, chamou-o de tudo -Jeca Tatu-; negou seus direitos; arrasou sua vida e logo que o viu crescer ela lhe negou, pouco a pouco, sua aprovação; conspirou para colocá-lo de novo na periferia, no lugar que contiua achando que lhe pertence (p.16)”.

Pois esse é o sentido da guerra que movem contra Lula. É uma guerra contra os pobres que estão se libertando. Eles não temem o pobre submisso. Eles têm pavor do pobre que pensa, que fala, que progride e que faz uma trajetória ascedente como Lula. Trata-se, como se depreende, de uma questão de classe. Os de baixo devem ficar em baixo. Ocorre que alguém de baixo chegou lá em cima. Tornou-se o Presidente de todos os brasileiros. Isso para eles é simplesmente intolerável.

Os donos e seus aliados ideológicos perderam o pulso da história. Não se deram conta de que o Brasil mudou. Surgiram redes de movimentos sociais organizados, de onde vem Lula, e tantas outras lideranças. Não há mais lugar para coroneis e para “fazedores de cabeça” do povo. Quando Lula afirmou que “a opinião pública somos nós”, frase tão distorcida por essa midia raivosa, quis enfatizar que o povo organizado e consciente arrebatou a pretensão da midia comercial de ser a formadora e a porta-voz exclusiva da opinião pública. Ela tem que renunciar à ditadura da palabra escrita, falada e televisionada e disputar com outras fontes de informação e de opinião.

O povo cansado de ser governado pelas classes dominantes resolveu votar em si mesmo. Votou em Lula como o seu representante. Uma vez no Governo, operou uma revolução conceptual, inaceitável para elas. O Estado não se fez inimigo do povo, mas o indutor de mudanças profundas que beneficiaram mais de 30 milhões de brasileiros. De miseráveis se fizeram pobres laboriosos, de pobres laboriosos se fizeram classe média baixa e de classe média baixa se fizeram classe média. Começaram a comer, a ter luz em casa, a poder mandar seus filhos para a escola, a ganhar mais salário, enfim, a melhorar de vida.

Outro conceito innovador foi o desenvolvimento com inclusão social e distribuição de renda. Antes havia apenas desenvolvimento/crescimento que beneficiava aos já beneficiados à custa das massas destituídas e com salários de fome. Agora ocorreu visível mobilização de classes, gerando satisfação das grandes maiorias e a esperança que tudo ainda pode ficar melhor. Concedemos que no Governo atual há um déficit de consciência e de práticas ecológicas. Mas, importa reconhecer que Lula foi fiel à sua promessa de fazer amplas políticas públicas na direção dos mais marginalizados.

O que a grande maioria almeja é manter a continuidade deste processo de melhora e de mudança. Ora, esta continuidade é perigosa para a mídia comercial que assiste, assustada, ao fortalecimento da soberania popular que se torna crítica, não mais manipulável e com vontade de ser ator dessa nova história democrática do Brasil. Vai ser uma democracia cada vez mais participativa e não apenas delegatícia. Esta abria amplo espaço à corrupção das elites e dava preponderância aos interesses das classes opulentas e ao seu braço ideológico que é a mídia comercial. A democracia participativa escuta os movimentos sociais, faz do Movimento dos Sem Terra (MST), odiado especialmente pela VEJA, que faz questão de não ver; protagonista de mudanças sociais não somente com referência à terra, mas também ao modelo econômico e às formas cooperativas de produção.

O que está em jogo neste enfrentamento entre a midia comercial e Lula/Dilma é a questão: que Brasil queremos? Aquele injusto, neocoloncial, neoglobalizado e, no fundo, retrógrado e velhista; ou o Brasil novo com sujeitos históricos novos, antes sempre mantidos à margem e agora despontando com energias novas para construir um Brasil que ainda nunca tínhamos visto antes?

Esse Brasil é combatido na pessoa do Presidente Lula e da candidata Dilma. Mas estes representam o que deve ser. E o que deve ser tem força. Irão triunfar a despeito das más vontades deste setor endurecido da midia comercial e empresarial. A vitória de Dilma dará solidez a este caminho novo ansiado e construido com suor e sangue por tantas gerações de brasileiros.

4 Comentários

  1. Octavio L. F. Leo
    set 24, 2010 @ 10:58:59

    Olha aí pessoal. Leiam o texto. Se informem. Vamos tomar conciência dos fatos. Saber interpretar, não se iludir com a mídia comercial que trabalha para mudar os fatos. A eleição está aí. Vejam realmente quem está e quem quer continuar ao lado do povo. Discernir, discernir sempre…..

  2. Jorge José Xavier
    set 24, 2010 @ 22:51:38

    Ainda bem que ainda existem pessoas que acreditam na gente que queremos mudar este País.
    Obrigado Teólogo Leonardo Boff pelas tuas palavras para nos animar nas nossas lutas.
    Já estamos cansados de sermos humilhados por salários congelados por alguém que se diz Governo do maior Estado deste país nos humilhando como trabalhares da Educação deste nosso Estado de São paulo. Por alguém que não tem capacidade de assumir as próprias incopetências, fazendo da Educação do Estado de São paulo a pior educação dos últimos tempos, alegando que os culpados somos nós os Educadores.
    Obrigado Teólogo por suas palavras.
    Paz e Bem

  3. Helena Y.Imamura Misawa
    set 25, 2010 @ 09:59:12

    Que Brasil queremos? O injusto, neocolonial, neoglobalizado e no fundo retrógado e velhista ou o BRASIL NOVO com sujeitos históricos novos, antes mantidos à margem e agora despontando com energias novas para construir um Brasil que nunca tínhamos visto antes?
    Muito obrigada DigníssimoTeólogo Leonardo Boff por este Manifesto , pois muitos , como eu, nos sentiamos angustiados por ter essa mídia Perversa que não cumpre o seu verdadeiro papel , de informar . Meu livro de cabeceira é SÃO FRANCISCO DE ASSIS Ternura e Vigor de sua autoria´´ e o senhor e o Padre Júlio Lancelotti são exemplos de vida, dignidade e Amor ao próximo para mim. Saudações, SEM MEDO DE SER FELIZ1

  4. Mercia Maria Almeida Neves
    jan 05, 2011 @ 01:52:06

    Olha, respeito muito o Pe Julio independentemente do “PARTIDO” a quem apóia, pois o que vemos,sentimos, é uma participação, téórica unido a prática com todo respeito às diferenças, seu partido é o amor, são os pobres, é o povo, o adimiro muito, o Télologo Lonardo Boff o conheço através de livros, que tive o prazer em ler: ‘Saber Cuidar” me apaixonei.Conheço sua luta.O respeito.
    Acho incoerente palavras tão duras direcionadas ao um governo anterior ao de Lula, ele encontrou, não desmererecndo suas qualidades, como boa nordestina, caminhos abertos, é inegável, existe a elite, existem, aliás os Parlamentares o são,e nunca saem de seus mandatos sem fazer parte delas, mesmo se opondo por algum motivo, e uma vez que são gastos milhões em cada campanha.
    Ora, LuLa não é nenhum pé de chinelo,e nem pobrezinho.Ele é Lula, diferente,usou isto a seu favor, parabéns ao Lula.FHC é sociólogo, professor, exilado, é um patrimônio também, reeleito também.
    Pertinenete lembrar dos aumentos diferenciados, dos aposentados, da salário minimo, e dos Parlamentares,ah, e da Presidenta, é anti-ético e soa ciníco.
    O texto, creio tem a intenção de alerta, usaria de mais cautela para não cair no mesmo erro daqueles que critica…veja, globo,Estadão,outros.
    Tomara Deus que nosso povo, país, crianças,professores, possam ir a escola sem medo da violência que assolam nossas vidas, melhor! volte para seus lares, e Deus tenha compaixão de que para que as “classes pobres” não submetam outros,que não sejam os milionários.
    Falo como leiga, como povo,e muito cuidado para que haja respeito entre minhas linhas e as do texto, ou seja: são duas faces, e quem paga sempre somos nós.Os juros comprovam isto.
    Bençãos.