A partilha do abraço e do pão
Antônio Mesquita Galvão
Pois, numa dessas, era uma luminosa manhã de maio, reuni amigos e parentes para festejarmos a vida. Na hora de servir o almoço, veio-me uma ideia. Lá em casa a gente sempre costuma orar nas refeições, e especialmente quando vêm visitas, para que estas entrem no clima.
Pois na hora do almoço, veio-me uma ideia à cabeça. Ao invés da usual reza do Pai-Nosso, de mãos dadas, apanhei um pão sobre a mesa, tirei um pedaço e o passei à Carmen que passou aos demais, convidando todos a partilharem o pão, enquanto carinhosamente se abraçavam. Falei rapidamente na necessidade premente de nossa sociedade brasileira em partilhar, socializar o pão e repartir a ternura, através do abraço. Todos emocionadamente aderiram à sugestão.
Em sua antológica “Oração pela Família”, padre Zezinho recomenda que a família celebre essa partilha, dentro de um contexto eminentemente evangélico e evangelizador. Jesus em sua trajetória pela poeirenta Palestina não fez outra coisa senão preconizar essa atitude, como sinal do reino que estava se instaurando no meio dos homens.
A realidade de nossos dias é cruel. Em nosso país, a disparidade de renda, de propriedade e de representatividade social é gritante, assimétrica e injusta, e por esse motivo produz miséria, sofrimento e revolta. Enquanto os homens públicos, de todos os Poderes da República, só pensam em seu bem-estar e na continuidade de suas carreiras e esquemas de sustentação, o pobre é oprimido, passa necessidade, sofre com o desemprego, a falta de moradia e de terra para plantar, e por causa vai perdendo seus referenciais de vida, e quem sofre mais com isto é a família, a mulher, as crianças. Por conta disto, instala-se como que um império de egoísmo, onde cada um vive para si, perde-se o sentido da solidariedade e da partilha. A ideia geral é cada um acumular, cada vez mais.
Isto é capaz de gerar, além do rompimento do equilíbrio do tecido social, um mal-estar de vontades, uma revolta diante do fechamento, tudo conduzindo a uma perigosa indiferença, que pode ser a gênese de muitos problemas psicossociais. Os impostos elevados a níveis imorais e absurdos, o aviltamento dos salários, a falência da justiça, a emergência do sistema bancário, a perda das garantias trabalhistas e de outros direitos sagrados, criam no ser humano uma atitude de impotência e de indignação, capazes de conduzir a comportamentos fora dos parâmetros da ética e da cidadania. A família absorve em sua estrutura todos esses percalços, dissolvendo-se e dando à sociedade – não-raro – indivíduos desestruturados, quando não marginais ou sociopatas.
Diante desse assalto e da desfaçatez moral, fica muito difícil, quando não impossível, celebrar qualquer tipo de partilha, uma vez que a sociedade, que deveria dar a primeira instância a dar o exemplo, se omite, se esconde e se encastela em seus projetos individualistas.