Contruir uma Europa em torno da pessoa humana, não da economia – Papa no Parlamento Europeu
Foi uma mensagem de esperança e de encorajamento que o Papa Francisco levou aos Parlamentares Europeus. Pondo em realce o mundo em mutação, menos eurocêntrico e uma União Europeia cada vez mais alargada, o Papa chamou, no entanto atenção para o envelhecimento deste continente, onde não obstante o projeto inicial de pôr a pessoa humana, dotada de dignidade transcendental, no centro de tudo, persistem hoje situações em que o ser humano é tratado como objecto que pode ser descartado quando não é útil.
O Papa sublinhou também o paradoxal abuso do conceito de direitos humanos ligado a uma reivindicação cada vez maior dos direitos individuais a despeito da conexão entre direitos e deveres e do contexto social em que as pessoas vivem.
A dignidade transcendente do ser humano leva a ver nele antes de mais um ser relacional. Mas hoje na Europa tende-se a difundir a solidão, agravada pela crise económica e pela falta de confiança nas instituições – afirmou o Papa – acrescentando:
“Tem-se uma impressão geral de cansaço e de envelhecimento, de uma Europa avô que já não é fértil nem vivaz. Os grandes ideais que inspiraram a Europa parecem ter perdido força de atracção em favor do tecnicismo burocrático das instituições” .
Condenando a absolutização das técnicas em relação à afirmação da dignidade e da preciosidade da vida humana, o Papa perguntou-se:
“Como voltar então a dar esperança ao futuro, confiança para continuar os grande ideais da uma Europa unida e de paz, criativa e empreendedora, respeitosa dos direitos e dos próprios deveres?”
O Papa Francisco respondeu a esta pergunta recorrendo a exemplos de arte e filosofia europeias que recordam a união entre Céu e Terra, sublinhando que uma Europa que não é capaz de se abrir à dimensão transcendental da vida é uma Europa que corre o risco de perder, lentamente, o seu “espírito humanístico”, a centralidade da pessoa humana”.
O Papa enalteceu depois o património cristão que contribuiu e continuará a contribuir agora e no futuro para o crescimento sócio-cultural da Europa. E essa contribuição – disse – não constitui um perigo para a laicidade dos Estados e para a independência das instituições da União. É sim um enriquecimento centrado no principio do humanismo, do respeito da dignidade da pessoa humana.
A Santa Sé está disposta a colaborar – através da COMECE, ao diálogo transparente e profícuo com as instituições europeias – prosseguiu o Papa recordando as numerosas injustiças e as violências barbáricas cometidas em relação a minorias religiosas, sobretudo cristãs, no mundo, perante o silêncio vergonhoso e cúmplice de muitos.
Recordando que o mote da União Europeia é a “unidade na diversidade” o Papa apelou ao respeito das diferenças, evitando uniformidade, o nominalismo politico, e liberando a Europa de manipulações e fobias. Mas não é tudo:
O desafio de reforçar as democracias europeias implica também a defesa das força politicas expressivas dos povos da Europa. Dar esperança à Europa significa investir nos âmbitos em que se formam os talentos das pessoas; criar condições favoráveis para a vida familiar; dar perspectivas às novas gerações; ao desenvolvimento; à educação a todos os níveis, uma formação que leve a olhar para o futuro com esperança.
O Papa não deixou de referir-se também à importância do empenho em relação ao ambiente e à protecção do Criado, utilizando-o para o bem comum. Recordando que o ser humano é parte fundamental do Criado, o Papa chamou mais uma vez atenção para o facto de milhões de pessoas morrerem de fome no mundo, enquanto que toneladas de comida são deitadas fora.
De entre os elementos indispensáveis para dar esperança à Europa, o Papa indicou também a questão do trabalho, voltando a sublinhar com força a urgência de dar dignidade ao trabalho, o que significa – disse – encontrar novas formas de combinar a flexibilidade do mercado com a garantia do trabalho e a possibilidade de construir família.
Não ficou de lado no intenso discurso do Papa a questão das migrações. Não é tolerável que o Mar Mediterrâneo se torne num cemitério – disse – solicitando legislações adequadas que saibam ao mesmo tempo tutelar os direitos dos cidadãos europeus e garantir o acolhimento dos migrantes. Mas é necessário também adoptar políticas concretas que ajudem os países de origem dos migrantes no desenvolvimento sócio-politico e na superação de conflitos internos, em vez de politicas de interesse que aumentam e alimentam tais conflitos.
Por fim o Papa Francisco sublinhou o papel da consciência da própria identidade num diálogo propositivo com os Estados que pediram para fazer parte da União Europeia, nomeadamente os países balcânicos; nas relações com os países vizinhos, de modo particular os que se debruçam sobre o Mediterrâneo.
E foi pela história de dois milénios que liga a Europa ao cristianismo que o Papa concluiu o seu discurso, recordando que essa história resta em grande parte por escrever a fim de se construir uma Europa que gira não em torno da economia, mas sim da sacralidade da pessoa humana e dos seus valores inalienáveis.
Chegou o momento de abandonar a ideia de uma Europa amedrontada e debruçada sobre si mesma para suscitar uma Europa protagonista, portadora de ciência, de arte, de música, de valores humanos e também de fé; uma Europa que olha, defende e tutela a pessoa humana.
Fonte: News.Va