Dom Helder: Uma Pessoa Linda de Viver!
Pe. Tarcísio Mesquita
No Dia 7 de fevereiro deste ano, comemorou-se o centenário do nascimento de Dom Helder Câmara. Brasileiro, Dom Helder nasceu em Fortaleza e, em vista de se tornar padre, com 14 anos, ingressou no seminário. Ainda muito jovem, com 22 anos e autorização especial dada por Roma, foi ordenado e posto a serviço da Igreja em sua diocese natal. Trabalhou arduamente em favor da educação e na defesa dos pobres. Foi ordenado bispo em 1952, sendo levado a atuar no Rio de Janeiro, onde reservou grande parte de sua atividade pastoral no socorro à população marginalizada, bem como assumindo o protagonismo na criação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e na Conferência Episcopal Latino-americana (CELAM). Em 1964, foi nomeado, pelo Papa Paulo VI, arcebispo de Olinda e Recife, onde permaneceu, vivendo em simplicidade e como grande pastor, até os últimos momentos enquanto seu coração pode bater.
Dom Helder pautou sua vida na prática do bem, por isso não vacilava em associar toda sua atividade a quem desejasse, como ele, superar os abismos que separam as pessoas, gerando tanta dor por todo mundo. Foi um homem mundialmente admirado. Lembro-me uma vez, ainda jovem padre, numa viagem à Europa, entrando na Madaleine, uma das belíssimas igrejas da capital francesa, ver uma foto de Dom Helder posta em lugar de destaque. Disse, orgulhoso, ao senhor que trabalhava naquele templo que eu era do Brasil e que já havia visto e conversado com dom Helder algumas vezes. Ganhei a maior atenção e deferência daquele homem simplesmente porque, além de conhecer Dom Helder, admirava-o tanto quanto ele, um francês sonhador pela erupção de um mundo totalmente pacificado.
Jamais esquecerei os relatos que tive a honra de ouvir da boca do próprio Dom Helder. Um destes, ainda hoje, provoca-me sentimento de hilariante ternura. Numa de suas viagens a São Paulo, em visita à Faculdade de Teologia desta arquidiocese, narrou-nos o dia em que, caminhando por Olinda, foi abordado por um grupo de crianças de rua que lhe pediram que as levasse ao cinema. Simples e simpático, vestido com sua usual batina bege, com a cruz de madeira de braços longos pendurada sobre o peito, Dom Helder aceitou levar a meninada para ver o filme ET, o Extraterrestre. Ficou vendo o filme com as crianças até o final. Quando a sessão acabou, já na rua, perguntou se as crianças tinham gostado do ET. Uma menina, talvez a mais sapequinha entre a turminha que o rodeava, respondendo por toda a criançada, disse a Dom Helder que o ET era muito parecido com ele: “baixinho, feinho, mas muiiiito bonzinho”.
Talvez muitos não saibam, mas foi Dom Helder quem subverteu a expressão lindo de morrer, muito ouvida nos idos da chamada Jovem Guarda, afirmando exatamente o contrário nos momentos em que esta expressão era de uso, dizendo com vigor e teimosia : “Lindo de Viver”. Entre as memoráveis frases deste “Irmão dos Pobres”, como foi surpreendentemente chamado pelo Papa João Paulo II, vale destacar duas: “As pessoas te pesam? Não as carregue nos ombros. Leva-as no coração.” e “Quando os problemas se tornam absurdos, os desafios se tornam apaixonantes.”.
Como brasileiro, tenho orgulho de ser compatriota do brasileiríssimo Helder Câmara. Como Cristão, tenho orgulho de ter a mesma fé deste homem santo. Como Católico, tenho orgulho de ser da mesma Igreja em que militou este bom pastor. Como ser humano, sinto-me orgulhoso de saber que somos muito mais que tanta mesquinhez, vaidade e ódio, porque Dom Hélder nos ensinou que, em qualquer tempo e lugar, o ser humano é lindo de viver.