Luta ecológica e o fracasso de Deus na história (I)
Jung Mo Sung
Se perguntarmos às pessoas se elas são a favor da preservação do meio ambiente, todas ou quase todas dirão que sim. Se perguntarmos se estão preocupadas com a crise ecológica, quase todas também dirão que sim. Mas, se perguntarmos a essas mesmas pessoas se essas preocupações as levaram a modificar o seu cotidiano ou os seus sonhos ou se diminuíram o seu padrão e quantidade de consumo e/ou pretendem a diminuir para adequá-los à crise ecológica, muito poucas dirão que sim. Em outras palavras, a preocupação ecológica hoje faz parte do que é considerado “politicamente correto”, mas parece que “no fundo” as pessoas não levam muito a sério essa questão.
Precisamos entender um pouco melhor essa defasagem entre a preocupação ecológica no nível do discurso e pouca mudança real nos comportamentos e nos desejos. Sem essa compreensão, as lutas, ações e discursos em favor da preservação das condições de vida no planeta Terra terão pouco efeito, ou cairão no vazio ou ficarão somente no nível das verborréias.
Neste artigo eu quero apontar apenas um dos aspectos importantes da “luta ecológica”, que tem a ver com a noção de sustentabilidade. A maior parte dos discursos em defesa do meio ambiente se refere a não sustentabilidade do atual padrão de vida e de desperdícios de recursos naturais essenciais, como a água. Isto é, se mantivermos as condições atuais, teremos muitos problemas no futuro. Em outras palavras, o problema grave não está no presente como um fato visível ou experimentável, mas como um potencial que se manifestará em um futuro próximo ou longínquo.
Isso significa que uma real preocupação com o meio ambiente pressupõe uma visão sobre o futuro. Se a pessoa não tem noção de futuro ou não se preocupa com o futuro, não consegue entender o que significa a crise ecológica, pois no presente esse problema não é muito sentido. O que nos leva à hipótese de que as pessoas que, mesmo aceitando as previsões dos estudiosos do assunto, não se preocupam de fato com a crise ambiental não têm preocupações ou dúvidas com relação às condições de possibilidade de vida humana no futuro.
Eu penso que a cultura atual, onde a ênfase é dada no viver o presente, reforça em muito essa despreocupação. Pois, se o mais importante é viver o presente, porque deveriam se preocupar com o que pode acontecer de mal no futuro. Porém, o ser humano é um ser que não pode não se preocupar (ocupar-se antes do acontecimento). Assim, mesmo em uma cultura que privilegia o viver o momento presente, as pessoas pensam no futuro. Só que a “cultura do presente” traz consigo também a idéia de que, se vivermos bem o presente, as coisas no futuro se ajeitarão.
A idéia de que as coisas no futuro se ajeitarão é bastante sedutora porque nos desobriga da responsabilidade com os nossos atos e opções no presente. E ela não é sedutora somente por causa da legitimação dessa alienação psicológico- subjetiva, mas também porque se articula com uma antiga doutrina religiosa, que diz que Deus está no comando da história, que o futuro está nas mãos de Deus.
Se o futuro está nas mãos de Deus, ou se Deus está no controle da história, não há o que podemos fazer e nem com o que se preocupar. Os religiosos conservadores norteamericanos ou influenciados por eles dizem que o futuro será Armagedom, destruição total que precederia a vinda gloriosa de Jesus no final dos tempos. Portanto, a crise ecológica não seria um problema, mas quase uma solução. Por outro lado, há muitos religiosos/as “otimistas” que dizem que a história tende a um final “feliz”, porque Deus, de um modo ou outro, irá conduzir a história para o “ponto ômega” (Teilhard de Chardin), ou então que o Espírito de Deus conduzirá a história e toda humanidade à sua plenitude. Há teólogos/as que afirmam que a “certeza” desse caminho da história em direção à plenitude é o outro lado da moeda da fé de que Deus se encarnou na pessoa de Jesus.
Se o futuro é negado enquanto futuro, isto é, se o futuro é apagado em nome da valorização absoluta do presente; ou se o futuro é negado enquanto um tempo aberto, cheio de possibilidades boas e más, por teologias ou filosofias da história que dizem que ela terminará necessariamente em um estado de caos ou de plenitude, a preocupação com o futuro e com a sustentabilidade das condições de vida no planeta Terra não tem sentido.
Para que a luta ecológica tenha sentido e eficácia, é preciso que o nosso discurso religioso ou político-social recupere o futuro como futuro e abandone o discurso sedutor e (teologicamente fácil) de que, por mais maldade que há no mundo, Deus, ou outra força sobre-humana, está conduzindo de modo misterioso a história para um final feliz. Assumir a ambigüidade da história e do ser humano, a possibilidade de que a história possa terminar em caos e que Deus possa “falhar” no seu plano de salvação da história, é uma condição para que a luta ecológica tenha sentido e eficácia.
teresa norma tadeu castellani
abr 14, 2009 @ 00:02:49
Quando li este artigo gostei muito e lembrei da minha mãe que só tinha o nivel primario e que hoje teria 77 anos de idade, ou seja, ela era de uma época em que nao se falava de ecologia. Era uma sabedoria natural e cristã com a economia da agua, da energia e o aproveitamento do alimento. Dizia sempre a mim e depois aos meus filhos: “Não gasta agua tem gente que nao tem nem para beber” “Não demora no banho, tem gente que nem furando poço acha agua” “Não deixa a torneira aberta” “Olha a luz acesa! Tem gente que não tem luz em casa” “Não deixa comida no prato, tem gente que nao tem o que comer” São frases simples que nos ensinava a preocupação em economizar para que todos pudessem usufruir, Se preocupava em economizar e em não desperdiçar para que todos pudessem ter também. Era assim um jeito simples de ser. Dessa maneira sem saber ela era moderna e ecológicamente correta. Era apenas preocupada com o outro.