José Saramago
Pe. Alfredo J. Gonçalves, CS
Partiu o sábio, o lutador, o poeta,
O velho guerreiro, o profeta;
Morreu como tudo que é eterno,
Das letras, incansável atleta.
Partiu o artista da palavra solta
Do verbo escorregadio e desregrado
Porque a vida transborda da gramática
Não cabe no discurso estreito e pontuado.
Como o lavrador de mãos calejadas,
Do chão levantou idéias e livros
Quentes e vibrantes, sóbrios e vivos,
Povoados de personagens amadas.
Seus parágrafos nas asas do vento
Longos de corpo, coração e de alma;
Carregados de beleza e sentimento,
De quem tem pressa, sem perder a calma.
Memória viva de uma teimosia,
Parte para engrandecer a trajetória,
O suor e a lida, a força e a resistência,
De quem da terra ergue a história.
A um tempo terno, ousado e sério
Do ser humano conheceu o mistério
Dele destilou lutas, dores e temores,
Sonhos e esperanças, beijos e amores.
Deixou páginas que são retratos,
De desenhos vivos e cores fortes,
Duro na crítica, simples no trato,
Legado sobre que nada pode a morte.
Obras que mais parecem esculturas
De silêncio, gemidos e gritos feitas;
Sinfonia livre que dispensa partitura,
Dos Silva ou Teixeira, Souza ou Freitas.
Metáforas imprevistas e inéditas,
Deixou-nos como arte e ciência;
No longo percurso da existência,
Sua herança jamais será pretérita.