Martírio e profecia na Igreja
Pe. Geovane Saraiva
“Ninguém tem maior amor do aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15, 13). Dar a vida se pode traduzir por generosidade, renúncia, doação e testemunho. No amor a Deus e ao próximo está o eixo central do cristianismo; tudo a partir do coração, por ser o centro da personalidade, onde se encontra seu fundamento, na busca da dignidade, da justiça e da solidariedade.
Neste sentido, já se passaram sete anos do assassinato da Irmã Dorothy Stang. Temos consciência de que o testemunho profético e a mística dessa fiel e corajosa discípula de Jesus de Nazaré, com seu sangue derramado na floresta amazônica, ainda irá produzir frutos, muitos bons frutos.
Irmã Dorothy afirmou, no momento em que foi imolada: “Eis a minha alma” e mostrou a Bíblia Sagrada. Leu ainda alguns trechos das Sagradas Escrituras para aquele que, logo em seguida, iria assassiná-la. Morta com sete tiros, aos 73 anos de idade, no dia 12 de fevereiro de 2005, em Anapu, no Estado do Pará, Brasil.
Diante do contexto da morte brutal da irmã Dorothy, fica muito presente a frase de Tertuliano, dita no século terceiro: “Sangue de mártires é sementes de cristãos”. “Evangelizar constitui, com efeito, o destino e a vocação própria da Igreja, sua identidade mais profunda. Ela existe para Evangelizar” (Evangelli Nuntiandi, 14), não fugindo da profecia e do testemunho, se for o caso, do martírio.
O modelo capitalista no Brasil, marcado pela desigualdade social e estrutural entrou com toda sua força também na Amazônia. Para a floresta amazônica, foi por opção de vida, a inesquecível Irmã Dorothy. Lá ela abraçou a proposta do Evangelho, vivido na simplicidade, mas com grande e profunda coerência. Uma mulher forte e determinada, no seu estilo de vida e com uma mística a causar medo e contrariar os que desejavam outro projeto para floresta, longe e distante do projeto de Nosso Senhor Jesus Cristo. Por isso mesmo tramaram: “Vamos matá-la”.
Irmã Dorothy está viva e presente da vida do seu povo, com sua vida oferecida em sacrifício, num verdadeiro hino de louvor a Deus, com sua coragem profética. Ela continua mais amada e admirada, tornando-se referência, símbolo e patrimônio do povo brasileiro, que sonha com uma nova realidade, aos olhos da fé.
Vivemos uma fé em que se afirma muito a dimensão do louvor e somos inteiramente favoráveis e temos plena convicção de que o nosso Deus é Senhor da vida e da história. Agora viver o mandamento maior: “Amarás o Senhor teu Deus de todo coração e a teu próximo como a ti mesmo” (MT 22, 37), significa ser uma Igreja pascal, na generosidade, na renúncia, na doação, no testemunho e na profecia, a exemplo de irmã Dorothy, no seu desejo de assemelhar-se ao Filho de Deus, ao doar sua própria vida pela floresta amazônica. Fica a pergunta: quando é que teremos uma Igreja verdadeiramente pascal, testemunhando sua fé no Senhor ressuscitado, segundo o pensamento de Tertuliano?