Mensagem de Dom Helder Camara

Frei Betto

De: [email protected]
Para: amigos e amigas

Queridos: estivesse entre vocês, a 7 de fevereiro comemoraria 100 anos de idade. Quis o bom Deus, entretanto, antecipar-me a glória de desfrutar Sua visão beatífica. Aliás, o Céu nada tem daquela imagem idílica que se faz na Terra. Nada de anjos harpistas e nuvens cor-de-rosa, embora a música de Bach tenha muita audiência.

Entrar na intimidade das três Pessoas divinas é viver em estado permanente de paixão. Arrebatado por tanto amor, o coração experimenta uma felicidade indescritível.

A propósito, outro dia, Buda, de quem sou vizinho, me contou esta parábola que bem traduz o caminho da felicidade: numa feira da Índia, entre tantos restos de frutas e legumes, uma mulher fitava detidamente o chão. Viram que procurava algo. Um e outro perguntaram o quê. “Uma agulha”. Não deram importância. Porém, quando ela acrescentou que se tratava de uma agulha de ouro, multiplicou o número dos que a auxiliavam na busca.

Súbito, um deles perguntou: “A senhora não tem ideia de que lado da feira a perdeu?” “Não foi aqui na feira”, respondeu a mulher, “perdi-a em casa”. Todos a olharam indignados. “Em casa?! E vem procurar aqui fora?” A mulher fitou-os e retrucou: “Sim, como vocês procuram a felicidade nas coisas exteriores, mesmo sabendo que ela se encontra na vida interior”.

O Céu é terno, o que não impede que experimentemos indignações. Jesus não fez a fome e a sede de justiça figurar entre as bem-aventuranças? Quando olho daqui para a Igreja Católica confesso que sinto, não frustração, mas uma ponta de tristeza. O papa Bento XVI não transmite alegria e esperança. Faltam-lhe o profetismo de João XXIII e a empatia de João Paulo II.

Padres cantores atraem mais discípulos do que aqueles que se dedicam aos pobres, aos lavradores sem-terra, às crianças de rua, aos dependentes químicos. Nas showmissas os templos ficam superlotados, enquanto nos seminários o ensino de filosofia e teologia costuma ser superficial.

A vida de oração não é estimulada, muitos buscam o sacerdócio para obter prestígio social e, por vezes, o moralismo predomina sobre a tolerância, o triunfalismo supera o espírito ecumênico. Até quando homossexuais serão discriminados por quem se considera discípulo de Jesus?

Alegra-me, porém, saber que as Comunidades Eclesiais de Base estão vivas e se preparam para realizar o seu 12o encontro intereclesial, em Rondônia, no próximo julho. Dou graças a Deus ao constatar que o CEBI – Centro de Estudos Bíblicos – conta com mais de 100 mil núcleos espalhados pelo Brasil, integrados por gente simples interessada em ler a Bíblia pela ótica libertadora.

Preocupa-me, entretanto, a polêmica entre os irmãos Boff. Tanto Leonardo quanto Clodovis são teólogos de sólida formação. Não considero justa a acusação feita por Clodovis de que a Teologia da Libertação teria priorizado o pobre no lugar do Cristo. O próprio Evangelho nos mostra Cristo identificado com os pobres, como ocorre na metáfora da salvação em Mateus 25, 31-46.

Francisco de Assis, com quem sempre me entretenho em bons papos, lembra que sem referência ao pobre, sacramento vivo de Deus, Cristo corre o risco de virar um mero conceito devocional legitimador de um clericalismo que nada tem de evangélico ou profético.

Tenho dito a são Pedro que sonho com uma Igreja em que o celibato seja facultativo para os sacerdotes e as mulheres possam celebrar missa. Uma Igreja livre das amarras do capitalismo, e na qual os oprimidos se sintam em casa, alentados na busca de justiça e paz.

Quanto ao mundo, lamento que a fome, por cuja erradicação tanto lutei, ainda perdure, ameaçando a vida de 950 milhões de pessoas e causando a morte de cerca de 23 mil pessoas por dia, a maioria crianças.

Por que tantos gastos em formas de ceifar vidas, como armamentos, e investimentos que degradam o meio ambiente, como pesticidas, desmatamentos irresponsáveis e cultivo de transgênicos? Por que tão poucos recursos para tornar o alimento – dom de Deus – acessível à mesa de todos os humanos?

Ao comemorarem meu centenário, lembrem-se dos princípios e objetivos que nortearam a minha vida. Malgrado calúnias e perseguições, vivi 91 anos felizes, pois jamais esqueci do que disse meu pai quando comuniquei a ele minha opção pela vida sacerdotal: “Filho, egoísmo e sacerdócio não podem andar juntos”.

3 Comentários

  1. TERESA NORMA TADEU CASTELLANI
    fev 01, 2009 @ 00:07:22

    Lindo !Lindo !Lindo! todo o texto
    Nos fez lembrar da forma de pensar de D Helder
    E nos enche de esperança e fé

  2. Eunice Molina.Curitiba
    fev 01, 2009 @ 12:23:55

    Hoje quero pedir licenca para deixar um recado para uma pessoa muito especial. É aniversário da nossa querida amiga Tereza. Quem não conhece a Tereza? Secretária há muitos anos da nossa Igreja de São Miguel. Amiga, compaheira, pessoa que cuida no Padre Julio com o mesmo carinho que as mães cuidam de seus filhos,cuida de suas vestes (sempre impecáveis) e tudo mais que ele precisa,sempre pronta a acolher a todos. Minha amiga que mesmo eu estando longe nunca se esquece de me reservar uma folhinha no inicio do ano e da lembrancinha da festa de São Miguel. Tereza, que mesmo de férias nunca deixa de ir às missas aos domingos e atender a todos com bondade e dedicacão. Quero deixar aqui amiga, nosso agradecimento por tudo.

    Quero te desejar felicidade, saúde, paz,e que Deus te abencõe muito.
    PARABÉNS!
    Recebe meu abraco e o de minha família nesse dia especial.
    Um beijo,
    Eunice

  3. Tatiana Capille Salles
    fev 01, 2009 @ 22:40:08

    Olá !!!!

    Também queremos deixar registrado nosso carinho pela Dona Tereza, senhora simpática, amorosa, dedicada, preocupada e cuidadosa, com o Pe. Julio, com a comunidade, com a Igreja/ Capela, com os noivinhos, enfim, com todos ….

    Que Deus lhe conceda ainda mais bondade e lhe abençoe imensamente !!!!

    Querida de todos nós !!!!

    Beijos, muito mais que carinhosos do casal
    Tatiana e Fernando.