Modo diferente de falar do amor
Leonardo Boff *
Frequentemente sou convidado para falar sobre o amor. Sinto certo constrangimento porque esta palavra – amor – é uma das mais desgastadas de nossa linguagem. E como fenômeno interpessoal, um dos mais desmoralizados. Para não repetir aquilo que todo mundo já sabe e ouve, costumo fazer uma abordagem inspirado num dos maiores biólogos contemporâneos: o chileno Humberto Maturana. Em suas reflexões o amor é contemplado como um fenômeno cósmico e biológico. Expliquemos o que ele quer dizer: o amor se dá dentro do dinamismo da própria evolução desde as suas manifestações mais primárias, de bilhões e bilhões de anos atrás, até as mais complexas no nível humano. Vejamos como o amor entra no universo.
No universo se verificam dois tipos de acoplamentos (encaixes) dos seres com seu meio, um necessário e outro espontâneo. O primeiro, o necessário, faz com que todos os seres estejam interconectados uns aos outros e acoplados aos respectivos ecossistemas para assegurar sua sobrevivência. Mas, há um outro acoplamento que se realiza espontaneamente. Os topquarks, a primeira densificação da energia em matéria, interagem sem razões de sobrevivência, por puro prazer, no fluir de seu viver. Trata-se de encaixes dinâmicos e recíprocos entre todos os seres, não vivos e vivos. Não há justificativas para isso. Acontecem porque acontecem. É um evento original da existência em sua pura gratuidade. É como a flor que floresce por florescer.
Quando um se relaciona com o outro (digamos dois prótons) e assim se cria um campo de relação, surge o amor como fenômeno cósmico. Ele tende a se expandir e a ganhar formas cada vez mais inter-retro-relacionadas nos seres vivos, especialmente nos humanos. No nosso nível é mais que simplesmente espontâneo como nos demais seres; é feito projeto da liberdade que acolhe conscientemente o outro e cria o amor como o mais alto valor da vida.
Nessa deriva, surge o amor ampliado que é a socialização. O amor-relação é o fundamento do fenômeno social e não sua consequência. Em outras palavras: é o amor-relação que dá origem à sociedade; esta existe porque existe o amor e não ao contrário, como convencionalmente se acredita. Se falta o amor-relação (o fundamento) se destrói o social. Sem o amor o social ganha a forma de agregação forçada, de dominação e de violência, todos sendo obrigados a se encaixar. Por isso sempre que se destrói o encaixe e a congruência entre os seres, se destrói o amor-relação e com isso, a sociabilidade. O amor-relação é sempre uma abertura ao outro e uma con-vivência e co-munhão com o outro.
Não foi a luta pela sobrevivência do mais forte que garantiu a persistência da vida e dos indivíduos até os dias atuais. Mas a cooperação e o amor-relação entre eles. Os ancestrais hominídios passaram a ser humanos na medida em que mais e mais partilhavam entre si os resultados da coleta e da caça e compartilhavam seus afetos. A própria linguagem que caracteriza o ser humano surgiu no interior deste dinamismo de amor-relação e de partilha.
A competição, enfatiza Maturana, é antissocial, hoje e outrora, porque implica a negação do outro, a recusa da partilha e do amor. A sociedade moderna neoliberal e de mercado se assenta sobre a competição. Por isso é excludente, inumana e faz tantas vítimas como a atual crise revelou. Ela não traz felicidade porque não se rege pelo amor-relação. A atual crise se originou, em parte, pela excessiva competição e pela falta de cooperação. Vale uma sociedade com mercado, mas não só de mercado.
Como se caracteriza o amor humano? Responde Maturana: “o que é especialmente humano no amor não é o amor, mas o que fazemos com o amor enquanto humanos; é a nossa maneira particular de viver juntos como seres sociais na linguagem; sem amor nós não somos seres sociais”.
Como se depreende, o amor é um fenômeno cósmico e biológico. Ao chegar ao patamar humano ele se revela como um projeto da liberdade, como uma grande força de união, de mutua entrega e de solidariedade. As pessoas se unem e recriam pela linguagem amorosa, o sentimento de benquerença e de pertença a um mesmo destino.
Sem o cuidado essencial, o encaixe do amor-relação não ocorre, não se conserva, não se expande nem permite a consorciação entre os demais seres. Sem o cuidado não há atmosfera que propicie o florescimento daquilo que verdadeiramente humaniza: o sentimento profundo, a vontade de partilha e a busca do amor. Estimo que falar assim do amor faz sentido porque nos faz mais humanos.
[Autor de Graça e experiência humana, Vozes].
* Teólogo, filósofo e escritor
Fonte: Adital
teresa norma
nov 07, 2009 @ 20:26:10
Lendo este texto lembrei da tarde de hoje em nossa reuniao sobre liturgia e o tempo do Advento por conseguinte falamos de amor. Adorei a reuniao e aprendi
Pesquisando na internet sobre essas ideias transmitidas neste texto li uma palestra de Leonardo Boff que fala de uma nova etica humana
“…A maior força… é o cuidado, pois ele permite que as coisas e as vidas durem mais tempo.
O cuidado é uma relação amorosa para com a realidade; anula as desconfianças e confere sossego e paz a quem o recebe. Onde há cuidado, não há violência. E tudo o que amamos, também cuidamos….”
A ética do cuidado se orienta na defesa da vida e das relações solidárias e pacíficas entre os seres humanos e com os demais seres da natureza. Como diz o poeta-cantador Milton Nascimento: “Há que se cuidar do broto para que a vida nos dê flor e fruto.”
Solange Bazan
nov 09, 2009 @ 12:09:18
Oi Padre Julio já estou em casa tive alta hospitalar ontem, quero agradecer ao senhor a visita e as orações questão sendo feitas para mim,e agradecer também a cmunidade por todas as correntes de orações que foram feitas. Espero logo estar de volta . Beijos á todos.
Julio Lancellotti
nov 09, 2009 @ 12:53:25
Solange que boa notícia ! Rezamos para que esteja cada vez melhor ! Força e coragem !
Rosana Sanfer
nov 09, 2009 @ 23:12:05
Olá Padre, temos um projeto que inclui os moradores de rua, teria um tempinho para podermos conversar?
julio
nov 10, 2009 @ 07:32:00
Rosana estou a sua disposição , pode ligar no fone da paróquia que está na site .