O deserto de D. Helder
Pe Geovane Saraiva
A glória humana e os reinos da terra estão longe do projeto de Jesus. “Jesus foi conduzido pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo. Jesus jejuou durante quarenta dias e quarenta noites, e, depois disso teve fome” (Mt 4,1-2). O filho de Deus, no deserto, é vitorioso porque vence o mal e o egoísmo com todos os seus frutos.
As tentações de Jesus resumem toda a luta da pessoa humana contra os poderes do demônio. As tentações do deserto são um resumo de toda vida do Enviado do Pai, com as riquezas de suas experiências. Ele, andando de lugar em lugar, de aldeia em aldeia, fazendo o bem a todos, durante toda sua pregação e seu ministério.
“Quarenta” é um número simbólico, muito usado na caminhada do povo de Deus. Expressa um tempo santo, um tempo abençoado (dias, noites e anos) em que Deus se revela e se manifesta, com sua presença e com graças especiais, na vida e no mundo dos seres humano. Jesus prossegue firme na sua caminha para o Pai; não se permite envolver.
Olhando para o contexto do Evangelho, Jesus no deserto, gostaria de me voltar para Dom Hélder Câmara, nosso conterrâneo, o “maior brasileiro de todos os tempos”, o “irmão dos pobres”, que soube entender e compreender o deserto da vida humana, como algo santo, sagrado. O irmão querido que não viveu só para si, mas viveu para Deus e vivendo para Deus, soube visibilizar os sinais dos tempos.
Dia 07 de fevereiro deste ano de 2009 foi um dia histórico, feliz e sagrado para todos nós; foi o dia do seu centenário! Há mais de 10 anos ele, no dia 27 de agosto de l999, ele partiu para o seio do Pai. Mas na verdade o nosso querido Dom Hélder não nos deixou. Ele está vivo e muito vivo; ele é imortal. Ele é nosso grande e maior patrimônio; patrimônio do povo brasileiro e toda humanidade, porque a humanidade o tem como cidadão universal.
Aprendi uma frase em latim que diz: “De mortuis nisi bonum”, isto é, “dos mortos só se fala o bem”. Como os homens de fé do deserto, Dom Helder soube viver e assimilar os caminhos de Deus, pela oração e pela profunda vida interior. Soube, com esperança, “Acreditar nas minorias capazes de compreender a ação, justiça e paz e adotá-las como campo de estudo e de atuação”. De modo que só temos boas recordações dessa figura humana que fez de sua vida um grande deserto; que fez de sua vida um hino de louvor a Deus.
Chegou o momento feliz e oportuno de fazermos a memória desse profeta, que soube falar de Deus com a alma, com as mãos e com o coração. Homem apaixonado por Deus e por suas criaturas. “Quarenta” é simbólico. Dom Hélder é um símbolo para todos.
Ele não é a “Paz”, mas no seu centenário, ao falarmos nele e dele, falamos da paz verdadeira e duradoura; falamos de tempo santo e abençoado, falamos da vida, dom precioso de Deus, falamos de um místico, de um homem profundamente de Deus, e por isso mesmo, profundamente humano.