Padre e egoísmo: NUNCA!
Pe. Geovane Saraiva
Dom Helder Câmara tem muito a nos ensinar, nós que procuramos mergulhar na sua vida, neste ano do centenário de seu nascimento. Ele que desde a juventude mostrou-se determinado e comprometido com a realidade social, com os empobrecidos, nunca se esquecendo do conselho de seu pai: “Meu filho, você sabe o que é ser padre? Padre e egoísmo nunca podem andar juntos. Padre tem que gastar-se, deixar-se devorar”.
Ao deixar o Ceará em 1936 para abraçar, como padre novo, uma nova missão na cidade do Rio de Janeiro, como técnico em educação do Distrito Federal, recebeu um conselho do seu bispo, que lhe disse: “Meu filho, é Deus, é Deus que está lhe chamando para o Rio de Janeiro. Aceite! Vá, meu filho, vá!”.
Foi para o Rio de Janeiro, trabalhou, trabalhou e ficou conhecido como o bispo das favelas. Mas seu superior, Dom Jaime de Barros Câmara, não gostava, não achava bom e reclamava do seu contato aberto, ao se dirigir as pessoas, dizendo: “O senhor não pode fazer isso. Um bispo da Igreja é um príncipe e um príncipe não pode se misturar”. Mas Dom Helder adorava se misturar! “Quantas vezes eu celebro em área de miséria e o meu povo canta: O Senhor é o meu pastor, e nada me pode faltar. Eu olho ao seu redor e vejo que está faltando tudo”.
Dom Helder confidenciou: “Uma de minhas maiores emoções, em toda minha vida, foi quando da abertura da primeira sessão do Concílio Vaticano II. Em sua aula inaugural, o Papa João XXIII disse com força: ‘Aqui estamos para a nossa conversão’ e ele mesmo se incluía. Isso significava que nós, cristãos, padres e bispos e até o Papa, precisávamos reaprender o Evangelho. A beber novamente da fonte d’água da vida que é o próprio Deus de Deus”.
Foi o bispo brasileiro mais influente em todo Concílio Vaticano II, com grande mérito abrir, para a Igreja, o caminho de renovação, da Igreja povo de Deus e que a mesma tinha que ir ao encontro dos sofredores e empobrecidos, dos “sem voz e sem vez”. Dizia ele: “Se eu não me engano, nós, os homens da Igreja, deveríamos realizar dentro da Igreja as mudanças que exigimos da sociedade. Não pense que Deus ajuda a miséria. Deus não aprova as injustiças. As injustiças sociais são problemas nossos”.
No século passado, Dom Helder foi a pessoa, entre todos os brasileiros, mais conhecida no exterior. Depois de Edson Arantes do Nascimento (Pelé) e Juscelino Kubitschek foi ele, sem dúvida, o nome sobre o qual mais se perguntava fora do Brasil.
Completando 10 anos da sua morte, neste 27 de agosto de 2009, dentro do seu centenário, somos convidados a acolher o amor como dom, como inspiração e proposta de vida. É importante olhar para convicção vocacional de Dom Helder, para o brilho de sua sabedoria, com raríssimas qualidades: inteligência, cultura e espírito de liderança e, ao mesmo tempo, com um incontestável amor por todas as pessoas do planeta, marcadas pela dor e sofrimento de toda natureza.