Papa, África e a manifestação do amor de Deus na opção pelos pobres
Jung Mo Sung
No encontro com os bispos da República dos Camarões, no dia 18/03/2009, o papa Bento XVI recordou da “da urgente necessidade de anunciar o Evangelho a todos. Este mandato, que a Igreja recebeu de Cristo, permanece uma prioridade, porque são ainda numerosas as pessoas que aguardam pela mensagem de esperança e amor que lhes permitirá ‘participar, livremente, da glória dos filhos de Deus’ (Rom 8, 21).”.
Com essas palavras, o papa reafirma que a prioridade da Igreja Católica – que também pode ser estendida a todas outras Igrejas cristãs – é anunciar o evangelho, que é a mensagem de amor e esperança, para que todas as pessoas possam viver livremente a condição de filhos e filhas de Deus. Para que a pregação da Igreja seja realmente anúncio da boa-nova de Jesus é preciso que ela seja marcada por e desperte nas pessoas o amor e a esperança. Para isso, esse critério geral de “amor e esperança” precisa ser encarnado em situações concretas das vidas das pessoas e dos povos através de palavras e ações que modifiquem a realidade no âmbito pessoal e social.
E hoje em dia não é possível anunciar palavras de amor e esperança na África subsaariana sem enfrentar os terríveis problemas pobreza e violência que afligem a vida de milhões de pessoas. Por isso, o papa afirma que “No contexto da globalização que bem conhecemos, a Igreja nutre um interesse particular pelas pessoas mais necessitadas. A missão do Bispo impele-o a ser o principal defensor dos direitos dos pobres, a suscitar e favorecer o exercício da caridade, manifestação do amor do Senhor pelos humildes. […] a Igreja quer, através da sua doutrina social, despertar a esperança nos corações dos marginalizados. Dever dos cristãos, sobretudo dos leigos que têm responsabilidades sociais, econômicas, políticas, é também deixar-se guiar pela doutrina social da Igreja, a fim de contribuírem para a edificação dum mundo mais justo onde cada um possa viver com dignidade”.
Dessa afirmação do papa, podemos tirar algumas reflexões importantes.
1) O “interesse particular pelas pessoas mais necessitadas”, uma outra forma de dizer “opção pelos pobres”, deve levar a Igreja e os cristãos a ações que melhorem a vida desses pobres, ações essas que são a “manifestação do amor do Senhor pelos humildes”. Isto é, o anúncio do evangelho, que como vimos acima deve ser mensagem de amor e esperança, deve ser suscitadora de ações em defesa de uma vida mais digna para pessoas necessitadas. Nesse sentido, a prioridade da evangelização deve se materializar e se encarnar também através da defesa dos direitos dos pobres. Assim, não há (ou não deveria haver) separação entre a evangelização e o que as Igrejas chamam de ação social. Essas não são duas ações que se complementam. A evangelização só é anúncio/prática da boa-nova de amor e esperança na medida em que transforma concretamente a vida das pessoas pobres.
2) Para o papa, os bispos devem ser aqueles que lideram, na Igreja, essa luta pela defesa dos direitos dos pobres. Portanto, para ele, os bispos que não se dedicam muito a essa tarefa porque a consideram uma tarefa menor ou alheia à sua missão de evangelização não estão cumprindo com a sua missão.
3) Na luta pela defesa dos direitos dos pobres, para que todos e todas possam “participar, livremente, da glória dos/as filhos/as de Deus”, devemos ser capazes de manifestar o amor de Deus. Nessas lutas, situações dramáticas e injustiças sociais gritantes causam tanta indignação que, muitas vezes, nos deixamos levar pela raiva que nasce da compaixão dos sofrimentos do povo e do cinismo dos insensíveis, e nos tornamos amargos e dedicamos toda nossa energia a denúncias. A nossa luta, seja pelo anúncio da Palavra ou da ação concreta, precisa ser suscitadora do amor e esperança, especialmente nas pessoas mais sofridas.
Suscitar esperança em situações difíceis não é uma tarefa fácil; assim como não é fácil tornar o amor presente nas relações humanas e sociais marcadas pela injustiça, violência, insensibilidade e cinismo. Mas, se fossem tarefas fáceis não precisaríamos da fé, da oração e da graça de Deus.
A missão das Igrejas cristãs é exatamente anunciar e testemunhar a boa-nova de que Deus fez a sua morada entre nós. A fé nos faz ver que a esperança e o amor que se manifestam na luta solidária para com e entre os/as mais necessitados/as são manifestações da presença de Deus no meio de nós.