Presbítero, o povo quer ouvir a Palavra que habita em ti!
Pe. Paulo Cezar Mazzi
A Palavra habita em ti?
“Homem de Deus, escolhido entre as nações. Profeta do Senhor: vai falar aos corações. Solta tua voz, o povo quer ouvir a Palavra que habita em ti!”. Essas palavras fazem parte da primeira estrofe do hino de entrada da missa que celebramos no último 04 de agosto em nossa Diocese, por ocasião do Dia do Padre. É digna de meditação esta frase: “O povo quer ouvir a Palavra que habita em ti!”.
Já foi constatado na penúltima Assembleia Geral da CNBB o fato de que a Igreja do Brasil vive uma época de declínio do seu profetismo, e isso não só por parte da maioria dos nossos Bispos, mas de nós padres também. Os motivos são múltiplos e não podem ser tratados no pequeno espaço desse artigo. O que penso ser importante resgatar aqui é a verdade dessa canção: primeiro a Palavra precisa habitar em nós, para somente depois poder ser ouvida pelo nosso povo, talvez numa referência à encarnação do Verbo: primeiro, Maria disse: “Faça-se em mim segundo diz a Palavra” (citação livre de Lc 1,38), e somente depois “o Verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14).
Como estamos no mês de setembro, celebrado como mês da Bíblia em nossa Igreja, achei oportuno escrever algo que nos ajude neste Ano Sacerdotal a perceber o que tem favorecido e o que tem atrapalhado a Palavra de habitar em nós. Isso nos leva a olhar para o silêncio. A experiência dos profetas, do próprio Jesus, dos apóstolos e dos grandes místicos da nossa Igreja revela algo muito claro: Deus não fala no barulho. Para que a Palavra habite em nós, é preciso que haja o espaço do silêncio em nossa vida de oração.
O silêncio se tornou algo irritante e quase que antinatural para nós, em nossa cultura moderna. A prova mais concreta disso é a dificuldade que temos para silenciar em nossos retiros. Sendo pedido de maneira incisiva ou tímida pelo pregador, o fato é que o silêncio acaba sendo esvaziado pela maioria de nós, com a justificativa de que precisamos aproveitar o momento do retiro também para conviver, para estreitar laços e para resolver problemas da Diocese que estão pendentes. Por trás dessas atitudes está a necessidade inconsciente que temos de nos defender do silêncio.
Existe uma resistência natural em nós para silenciar. Estamos tão acostumados com o barulho que, quando tentamos silenciar, nos sentimos como um viciado em droga entrando no seu doloroso período de abstinência, expressão que tomo emprestada de Henri Nouwen. A consequência da falta de silêncio, segundo este autor, pode ser assim sintetizada: “As perguntas que vêm de dentro ficam sem resposta. Os sentimentos incertos não são esclarecidos, os desejos emaranhados não são organizados, e as emoções confusas não são compreendidas”.
“O povo quer ouvir a Palavra que habita em ti!”. Embora saibamos que o povo quer ouvir a Palavra que habita em nós, nossa palavra parece estar soando apenas como vento, como está escrito: “Concebemos e tivemos as dores de parto, mas quando demos à luz, eis que era vento: não asseguramos a salvação para a terra; não nasceram novos habitantes para o mundo” (Is 26,18).
Neste Ano Sacerdotal seria bom que cada um de nós meditasse sobre essa verdade tão simples: “O povo quer ouvir a Palavra que habita em ti!”. Por mais que estudemos e preparemos bem as nossas homilias, é bom ter a humildade de reconhecer que a Palavra não pode ser produzida por nós. Ela só pode vir e fazer sua morada em nós, para então ser comunicada ao nosso povo. A nós cabe fazer como Maria: permitir que a Palavra se faça em nós, que faça da nossa vida um eco da sua verdade, da única verdade capaz de libertar (cf. Jo 8,32). É assim que ajudaremos a assegurar a salvação para a terra. É assim que ajudaremos a nascer novos habitantes para o mundo…