Quando o espírito de Deus soprou
Maria Clara Lucchetti Bingemer
Se a Páscoa é a festa máxima do cristianismo, quando na vitória de Jesus Cristo sobre a morte nós, cristãos, celebramos o destino finalmente redimido da condição humana – viver plenamente, sem medo de um fim que não existe -, Pentecostes é a festa da criação como um todo. Nela, o Espírito é derramado sobre toda carne, suscitando naqueles ali reunidos uma comunicação universal e sem barreiras, que acaba com a incomunicação instaurada pela babelização das línguas e o consequente desentendimento entre os seres humanos.
Por isso, Pentecostes é a festa da diferença reconciliada e integrada na totalidade daquilo que foi o sonho de Deus na criação, quando pela Palavra e o Espírito disse: Faça-se e tudo se fez: luz, terra, biodiversidade, vida humana, amor, fertilidade e fecundidade. Pentecostes é a festa onde a nostalgia e a orfandade se tornaram comunidade e missão. Comunidade dos que creram em Jesus de Nazaré, choraram sua morte e com ela sentiam-se perdidos e perplexos. Missão destes mesmos que agora, com a ressurreição do Mestre, são transformados em testemunhas intrépidas e corajosas que a tudo enfrentam para anunciar ao mundo a boa nova de que aquele que estava morto agora vive e não deve ser buscado em túmulos e cemitérios, mas sim no olhar brilhante e no coração ardente dos que nele creem e experimentam sua presença mais forte do que nunca.
Naquele Pentecostes, primeiro fez-se verdade a frase que Paulo escreve na carta aos gálatas: Não há judeu nem grego, nem escravo, nem homem, nem mulher, pois todos são um só em Cristo Jesus. Assim sucedeu quando os apóstolos, iluminados pelo Espírito, falaram a uma multidão de todas as raças e línguas e foram entendidos, seu anúncio recebido e a missão que continha esse anúncio praticada. Assim a Igreja já nasce sob o signo da universalidade e proclama ao mundo sua missão: anunciar Jesus Cristo e fazer acontecer seu reino.
Por isso Pentecostes é a festa da Igreja, mas uma Igreja que não permanece fechada em suas fronteiras; abre as portas para dialogar com todos e a cada momento ser reinventada a partir do encontro e do diálogo com outras culturas e outras realidades e línguas. Pentecostes é a festa de uma Igreja que não faz acepção de pessoas e anuncia a todos e a cada um a boa nova da qual é depositária. Pentecostes é a celebração de uma identidade eclesial que não quer impor-se pela força, mas apresentar um dom e um presente, e a partir dai reencontrar sua identidade.
Hoje, em um mundo não mais hegemonicamente cristão, mas fragmentado pela secularidade e a pluralidade multifacética, a celebração de Pentecostes recobra todo um sentido que resgata aquilo que de mais profundo está em suas origens: o fato de desejar estar ali onde estão as pessoas, as coisas, tudo o que é criado por Deus para ajudar humildemente a que a vida aconteça. Por isso, a celebração de Pentecostes configura uma Igreja desejosa de que não haja fronteiras que não sejam ultrapassadas, que não haja bloqueios que não sejam superados, que não haja discriminações que não sejam reconciliadas, que não haja traumas que não sejam curados.
Pentecostes é a festa da pluralidade do criado. E, como tal, é a festa do amor que, fiel à sua identidade fecunda e criativa, integra e plenifica tudo aquilo que toca. Celebrar Pentecostes é compreender, é experimentar que ser cristão é crer sobretudo nesta humanidade que Deus ama e que é capaz de fazer de suas contradições ponto de partida para crescimento e plenitude.
Tânia Serrano Ramos
jun 11, 2011 @ 00:24:21
“Como o Pai me enviou, também eu vos envio”… Espírito Santo … por Ele somos filhos no Filho e estamos em comunhão com o Pai … para sempre … * A * M * É * M *