Sacerdote, por que és?
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Fonte: site da CNBB
No turbilhão das grandes mudanças que afetam profundamente a vida contemporânea, entre as argumentações de defesa da laicidade do estado, ou nas incidências da linguagem do pensamento pluralista das sociedades, a Igreja Católica, no mundo inteiro, convocada pelo Papa Bento XVI, vivencia um Ano Sacerdotal – desde 19 de junho, festa do Sagrado Coração de Jesus, dia mundial de oração pela santificação dos padres. Diante de todas essas mudanças, do pluralismo e, particularmente, no centro da questão crucial para a vida humana – o seu sentido, incluindo a compreensão de onde viemos e para onde vamos – a Igreja, profeticamente, recoloca esta pergunta no seu próprio coração e na pauta dos assuntos que interessam os andamentos da vida do mundo neste momento grave e desafiador de sua história: Sacerdote, porque és?
O ministério sacerdotal é um dom para a Igreja e para o mundo. Urge aprofundar a compreensão das medidas e o alcance do sacerdócio como dom. O padre como dom. E sendo assim, o sacerdote é dádiva de Deus. O Santo Cura d’Ars, São João Maria Vianey, patrono dos padres, aquele que tocou com o seu ministério, de modo admirável e inesquecível, a vida da França, no seu tempo, afirmava, ‘o sacerdócio é o amor do coração de Jesus’. Agradecido pelo dom do seu sacerdócio, que fez de uma vila sem importância, em razão da excelência de sua vida sacerdotal, o grande centro de referência, batendo, pelas razões da busca de Deus e do sentido para a vida, a imbatível Paris de todos os tempos. Como dom, o sacerdote não é promotor e agente de um tipo de mercado religioso que hoje se multiplica. Embora perdendo forças, nos cenários contemporâneos, com a mercantilização de milagres e curas, arrebanhando incautos e sofridos, amalgamando tudo com uma linguagem que inclui gritarias e uma sensação de manipulação de Deus. Deus é amor. Jesus Cristo é o amor encarnado de Deus. O amor vem de Deus.
E todo aquele que ama nasceu de Deus – e conhece a Deus. Quem não ama não chegou a conhecer Deus. Pois Deus é amor, ensina o evangelista João na sua primeira carta. Ele continua, ‘foi assim que o amor de Deus se manifestou entre nós: Deus enviou o seu Filho Único ao mundo para que tenhamos a vida por meio dele. Nisto consiste o amor: não fomos nós que amamos a Deus, mas foi ele que nos amou e enviou o seu Filho como oferenda de expiação pelos nossos pecados’ (I Jo 4,7-10).
O sacerdote é dom porque o seu ministério sacerdotal, desdobrado em conduta, serviços, vivências e posturas, é manifestação e concretização deste amor. O Padre, homem escolhido entre homens e constituído em favor de todos, é discípulo missionário servidor do povo de Deus. E sustentado pela contínua busca da santidade de vida, é facilitador desse indispensável e inadiável encontro pessoal com o Cristo vivo, levando todos ao reconhecimento e à sabedoria de pautar a sua vida tendo Deus como seu centro e fonte inesgotável do seu sentido. O sacerdote, por isso mesmo, faz anteceder às suas muitas tarefas no labor de cada dia a serviço do povo, anunciando o Evangelho, o cuidado e o compromisso com a condição do seu ser. É a santidade de vida que alavanca, fecunda e torna exitoso o serviço prestado na condição própria de sacerdote.
Um olhar atento e sincero deve ser lançado sobre a presença e vivência sacerdotal neste momento da vida da Igreja e de sua missão no coração do mundo. Não deixando de considerar e tomar providências quantos aos descompassos de vidas e condutas sacerdotais questionáveis, é preciso reconhecer a magnitude, em quantidade e extensão, do serviço de padres na vida de famílias, de pessoas, de grupos, dos pobres, na cultura e na congregação das comunidades de fé. Fazendo deste serviço uma escola de amor, longe do modelo de mercado religioso de milagres e curas.
Um compromisso empenhado para ser e fazer de todos discípulos pela escuta da Palavra de Deus, interpelando vidas e condutas, e pela vivência dos sacramentos como fonte amorosa da graça de Deus que transforma e sustenta. O sacerdote, pois, não é um mero delegado na comunidade, mas um dom para ela, pela unção do Espírito Santo e por sua especial união com Cristo. Na cultura atual, o padre é chamado a conhecê-la profundamente, conduzindo todos, como facilitador, para beber na fonte do mistério do amor de Deus, pela Palavra e pelos Sacramentos. O sacerdote está empenhado no caminho missionário da Igreja como “advogada da justiça e defensora dos pobres”, assim afirma o Papa Bento XVI. O mundo precisa de sacerdotes. A Igreja, no conjunto amplo de sua missão a serviço da vida, orando e refletindo, empenha-se e se compromete com a qualificação permanente dos seus sacerdotes fazendo deles verdadeiro dom na vida do mundo, um servidor indispensável.