Santa Margarida Maria Alacoque

16 de Outubro

Santa Margarida Maria Alacoque nasceu na aldeia de Lautecour, na Borgonha, no dia 22 de Julho de 1647, no seio duma família religiosa, honesta, de boa posição, reputação e de seriedade. Seu pai, Claude Alacoque, era notário real. Sua mãe, Philiberte Lamyn era filha também dum notário do rei, François Lamyn.    
       

 

Horror ao pecado

Os seus pais perceberam logo o horror que Margarida Maria tinha pelo pecado quando ainda era pequena de três anos. Bastava lembrar-lhe que um ato qualquer ofendia a Deus para que a menina se afastasse horrorizada. Nas suas memórias a Santa afirma que Deus lhe fez ver “o grande horror do pecado, o que me horrorizou tanto que a mais mínima mancha resultava para mim num tormento insuportável.” (1)

A essa aversão ao pecado acrescentou-se logo um agrado muito grande pela oração e pela penitência, juntamente com uma tendência enorme para ajudar os pobres. “Deus, escreve a Santa, deu-me um amor tão terno pelos pobres que eu teria desejado só ter contato com eles. Ele incutiu-me uma compaixão tão grande pelas suas misérias que, se estivesse em meu poder, abandonaria tudo por eles. Quando tinha dinheiro, dava-o aos pobres para os estimular a aproximarem-se de mim e então ensinava-lhes o Catecismo e a rezar.” (2)

Dos quatro aos sete anos, ou seja entre 1652 e 1655, seguindo um costume comum na época, foi morar no castelo de sua madrinha, Madame de Corcheval, dama nobre da região. Ali, num ambiente sereno e austero, começou a sua formação.

Duas senhoras ocupavam-se da sua educação. Uma era simpática e gentil. Margarida Maria, porém, fugia dela. A outra era severa e impertinente. Curiosamente Margarida sentia atração por esta última. Ninguém conseguia compreendê-lo. Mais tarde perceberam que este fato era mais um sintoma de que a proteção divina pairava sobre a menina. A primeira senhora levava uma vida irregular; a segunda era de uma conduta sem mancha. Nisto se manifestava o seu horror instintivo ao pecado.

A sua educação teve de ser interrompida quando morreu Madame de Corcheval. A sua afilhada tornou à casa paterna. Mas em 1655, no mesmo ano da morte de sua madrinha, falece também o seu pai. A mãe, com o objetivo de melhorar a situação patrimonial que o marido deixara complicada, e não dispondo do tempo necessário para providenciar a educação da filha, mandou-a como pensionista para um convento de Clarissas, o que era muito freqüente então.

No silêncio dos claustros, refletindo durante longas horas no recolhimento e observando a modéstia e o espírito de oração das irmãs, Margarida sentiu o chamamento à vida religiosa. Foi ali onde, por volta dos nove anos, recebeu pela primeira vez Jesus Sacramentado. A partir de então, as graças na oração e o seu gosto pelo recolhimento aumentaram sensivelmente.

A jovem Margarida Maria tinha de completar junto às Clarissas a educação que recebia habitualmente uma menina de sua condição para ser mãe de família e também dama de sociedade. Isto significava uma sólida formação moral, na qual se punha especial cuidado nos hábitos de modéstia, discrição e domínio de si mesma.

Tal educação completava-se com o ensino da arte da conversa, música, pintura, dança… que desenvolviam a delicadeza, o tato, o bom gosto. Dessa forma florescia nas pensionistas o sentido da proporção, da naturalidade bem educada, ao mesmo tempo que recebiam uma capacidade de julgar as pessoas e os fatos.

Judiciosa, sensata e caritativa

O seu espírito equilibrado e alguns traços da educação recebidos por Santa Margarida Maria foram entendidos mais tarde pela Madre Greyfié, uma das suas superioras em Paray-le-Monial, que a descreveu assim: “Era naturalmente judiciosa, sensata e tinha um espírito bom, humor agradável e o coração mais caritativo que se possa imaginar; numa palavra pode dizer-se que era uma criatura das mais aptas para ter êxito em tudo.” (3)

No pensionato das Clarissas, Margarida Maria contraiu uma doença grave, pelo que foi preciso reenvia-la à casa da mãe. Ali permaneceu cerca de quatro anos prostrada na cama, sem conseguir levantar-se. Deus Nosso Senhor visitava-a com o sofrimento. Só em 1661 recuperou a saúde depois de fazer um voto à Santíssima Virgem.

Na sua casa, outra situação muito dolorosa a aguardava. Sua mãe tinha transferido a gestão do patrimônio a um cunhado, Toussaint Delaroche, homem avaro e de temperamento irritável. A Santa suportou durante anos a quase escravidão a que a submetiam as injustiças do tio. Às vezes tinha de mendigar pão ao vizinho. A casa materna transformou-se então numa prisão torturante. “Não tínhamos já nenhum poder em casa e não ousávamos fazer nada sem seu consentimento”, escreveu a Santa. Passava horas num canto do jardim a rezar ou refugiava-se na capela da aldeia. Mas nem sequer lá encontrava repouso: o tio acusava-a de sair de casa para ver os rapazes. “Às vezes os pobres da aldeia, por compaixão, davam-me um pouco de pão, de leite ou alguma fruta na parte da tarde”. (4)

Reparação, desagravo, amor à Cruz

Deus permitia esses sofrimentos para a preparar para a vida de renúncia e expiação que depois abraçaria com entusiasmo. Santa Margarida Maria devia pregar a devoção da reparação o do desagravo
ao Sagrado Coração de Jesus; precisava ser um modelo dessa atitude de alma. Os sofrimentos desta etapa da sua vida, aceites com paciência exemplar, fortificaram-na para a vida de reparação que a Providência tinha escolhido para ela. Durante este período a Santa recebeu graças místicas extraordinárias. Além disso, já desde muito pequena, teve um trato muito familiar com Nosso Senhor. “(O Salvador) sempre estava presente sob a figura do crucificado ou do Ecce Homo a carregar a Cruz, o que me produzia tanta compaixão e amor ao sofrimento, que todos
os meus sofrimentos pareciam leves em comparação com o desejo que experimentava de sofrer para me conformar com o meu Jesus sofredor.” (5)

Tal compreensão do valor do sofrimento na vida espiritual foi crescendo nela e será uma das características da sua santidade. Mais tarde, já visitandina, esta pioneira dos caminhos de Deus, dirá: “Deus deu-me tanto amor à Cruz que não consigo viver um momento sem sofrer: mas sofrer em silêncio, sem consolo, alívio ou compaixão; e morrer com este Soberano da minha alma, sob o peso de toda sorte de opróbrios, dores, humilhações, esquecimentos e desprezos…” (6)

O amor à Cruz foi característico em Santa Margarida Maria e é também condição indispensável de qualquer forma de santidade: “Jesus disse então aos discípulos: se alguém quiser vir comigo, renuncie a si mesmo, tome sua Cruz e siga-me.” (Mt. 16,24)

Provações familiares

A sua família, de início, quis encaminha-la para um convento de Ursulinas onde já vivia uma prima. Santa Margarida Maria – que era muito afeiçoada a essa prima, deu-lhe uma resposta gentil em que transparece o seu grande desejo de perfeição: “Olha, se entro no teu convento será por amor a ti. Mas quero ir a um convento onde não tenha parentes nem conhecidos para ser religiosa só por amor a Deus.” (7)

Uma voz interior tinha-lhe advertido: “Não te desejo lá, mas em Santa Maria”, que era o nome do convento de Paray-le-Monial. (8)

Entretanto as pressões familiares para que optasse pelas Ursulinas continuavam. Mas uma doença da mãe e também de um irmão, forçaram-na a prolongar os seus planos de vida religiosa.

Numa certa altura, um sacerdote franciscano hospedou-se na casa dos Alacoque durante uma missão. Santa Margarida Maria aproveitou a ocasião para fazer uma confissão geral. Ao conhecer o alto grau de virtude e os desejos de vida religiosa da jovem, o padre julgou que devia seguir a sua vocação. O religioso falou com o irmão e convenceu-o a mudar de atitude. A prova em casa acabava. Outras cruzes, mais dolorosas, viriam no Convento da Visitação de Paray-le-Monial, aonde foi ter em seguimento de uma clara inspiração da Providência.

A nossa Santa foi ali aceita como noviça a 20 de Junho de 1671; vestiu o hábito a 25 de Agosto do mesmo ano e fez a profissão solene a 6 de Novembro de 1672. Assim ficava preparado o quadro para a mensagem do Sagrado Coração de Jesus.

A missão de Santa Margarida Maria Alacoque

Em 1647, quando nasceu Santa Margarida Maria, a devoção ao Sagrado Coração não era muito conhecida, se bem que já existia. A sua missão foi dar-lhe um impulso e uma difusão universal, precisar o seu espírito, adapta-lo às necessidades da Igreja nos tempos modernos e fixar as práticas de piedade mais adequadas às novas circunstâncias.

Santa Margarida Maria foi uma simples freira que nunca transpôs os muros do seu convento e morreu antes de completar 45 anos, em 1690. A Providência compraz-se deste modo em realizar um desígnio imenso a partir de uma humilde religiosa que, para fugir do mundo, tinha-se retirado a um obscuro convento da Ordem da Visitação e levou ali uma vida apagada aos olhos dos homens e até das freiras visitandinas com as quais convivia.

O quadro hoje é completamente diverso. Ornato da Ordem da Visitação, a religiosa então apagada foi elevada ao ápice de glória na Igreja e, do alto dos altares, da sua santidade despede raios de salvação à terra inteira, enquanto a maioria dos homens famosos e importantes da sua época são desconhecidos pelos nossos contemporâneos.

O Papa Pio XII, depois de fazer a lista dos Santos que a precederam na prática e difusão da devoção ao Coração de Jesus, diz a este propósito: “Mas entre todos os promotores desta excelsa devoção, merece um lugar especial Santa Margarida Maria Alacoque que, com a ajuda do seu diretor espiritual, o Beato Cláudio de la Colombière (hoje santo) e com o seu zelo ardente, obteve, não sem a admiração dos fiéis, que este culto adquirisse um grande desenvolvimento e, revestido das características do amor e da reparação, se distinguisse das demais formas da piedade cristã.”