Todos os Santos

Primeiro de novembro é o dia de todos os Santos.

Celebrar todos os santos é celebrar a santidade de Deus que manifesta-se nos seus filhos e filhas. Só Deus é santo, mas nós somos sua imagem e semelhança, por isso somos chamados à santidade. Deus é amor e quanto mais vivermos no amor, mais seremos semelhantes a Deus.

A santidade é sermos semelhantes a Deus, não tomando o Seu lugar, mas vivendo em todo lugar em sintonia com seu amor e sua bondade.

A grande pergunta que nós podemos fazer é a seguinte: é possível ser santo em São Paulo? A nossa cidade é lugar da santidade de Deus? E mais ainda, o que é ser santo em São Paulo?

A nossa cidade cheia de tão grandes desafios, contradições e conflitos, é espaço favorável a viver na santidade. Muitas vezes temos introjetado que o santo, a santa são pessoas imóveis, estáticas, caladas e que não se posicionam frente aos conflitos sociais, políticos e de interesses. Os que vivem a santidade gostam do silêncio da oração, mas não se calam diante das injustiças e opressões que atingem principalmente os mais fracos e frágeis. Os santos não são super-homens e as santas não são super-mulheres, mas pessoas que na sua fragilidade confiam na força amorosa de Deus que é o protetor e defensor dos pobres.

A nossa cidade e em geral as cidades brasileiras são o retrato da enorme desigualdade que atinge a tantas pessoas, privando-as da sua humanidade, quando as impossibilita o trabalho, o alimento, a saúde, a educação, a moradia, a dignidade e as possibilidades de ser livres e felizes.

A santidade é a glória de Deus na vida de seus filhos e filhas. Santo Irineu nos ensina que “a glória de Deus é que seus filhos vivam”. Vivam e não sobrevivam em condições humilhantes e indignas.

A santidade é situada, é datada, não é um processo alienante e abstrato, tanto que para ser declarado santo a vida da pessoa é examinada em todas as circunstâncias de seus atos, escritos, palavras, atitudes, buscando entender como enfrentou as dificuldades e conflitos de seu tempo e como conviveu com seus contemporâneos a fidelidade no seguimento de sua fé.

Os santos e santas são pessoas marcadas pelo seu tempo e que souberam perceber o apelo de Deus pelo discernimento de buscá-lo e amá-lo acima de tudo, não tendo medo de assumir e viver o escândalo da cruz, das perseguições e do martírio.

Os santos não são privilegiados que podiam ficar sem comida e não sentir fome, serem alvejados sem se ferir ou sentir dor, sofrer sem sofrimento. Os santos e santas são pessoas humanas, sujeitas à solidão, cansaço, lágrimas. Muitos foram prisioneiros, torturados, massacrados, assassinados. Muitos foram exilados, expulsos de suas cidades e tratados com extrema crueldade, mas se mantiveram firmes nas suas opções e fiéis adoradores ao Deus de Jesus, sem se render aos ídolos que surgem em todas as épocas favorecendo a idolatria e o pecado do egoísmo e do oportunismo.

A santidade não é a busca do sofrimento, não é exercício de masoquismo, é a felicidade de quem ama e vence o medo e, com fidelidade, assume as conseqüências do seu amor.

Amar traz conseqüências, não é possível amar e não se transformar e colocar sua vida em risco ou em vulnerabilidade. O amor nos fortalece e fragiliza, nos santifica.

Os santos e santas são sinais para nós de que o que Deus pede é possível, é para nos animar de que pessoas frágeis como nós foram capazes de superar os desafios e viver com fidelidade até o fim.

São operários, desempregados, doentes, viúvas, idosos, aposentados e pensionistas de ontem e hoje, mães e pais que não têm como alimentar seus filhos e filhas, jovens afundados nas dificuldades, mas que, com fé, se organizam e se unem para construir o Reino de Deus. Viver como irmãos e irmãs que podem chamar a Deus de Pai para juntos poder repartir o pão.

Neste dia de todos os santos somos todos responsáveis em promover a santidade de Deus em nossa cidade, principalmente defendendo os fracos, frágeis, os excluídos e marginalizados, promovendo a santidade da inclusão e tirando da cruz os crucificados de nosso tempo.

Santos e santas de todos os tempos, rogai por nós!
São Martinho de Lima, protetor do povo da rua.
Santa Maria Eufrásia, protetora das mulheres pobres, marginalizadas e presas.
São João Eudes, defensor e protetor das mulheres prostituídas.
São Maximiliano Kolbe, preso e condenado a morte de sede e fome.
São Pedro Nolasco, defensor e protetor dos prisioneiros.
São Tomás Morus, mártir da verdade e dignidade humana.
Santa Edith Stein, mártir do povo perseguido e fiel a sua fé.
Santa Josefina Bakita, roubada de seu povo, escravizada e amorosa com as crianças.
D. Oscar Romero, assassinado no altar por defender os pobres e perseguidos.
Santo Dias da Silva, operário morto pela polícia durante greve em São Paulo.
Santa Catarina de Sena, analfabeta, doutora da Igreja, defensora e protetora dos doentes e encarcerados.
Enfim, tantos irmãos e irmãs nosso que fizeram de suas vidas a verdade das palavras do Senhor Jesus: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus irmãos”.

Jesus hoje está nos presídios, nas favelas, nos cortiços, nas ruas, embaixo dos viadutos, nos hospitais, nos asilos, na exclusão, no esquecimento, agredido e evitado de novo a nos dizer: “Tudo o que fizestes a um destes pequeninos, foi a mim que o fizestes”.

Todos os santos é a santidade de todos nós, para que todos tenham vida e a tenham plenamente.

Pe. Júlio Lancellotti

Um Comentário

  1. Sarah
    nov 01, 2008 @ 13:51:44

    Simplesmente maravilhoso! O nosso querido Pde.Julio sempre com suas belas palavras,cheias de sabedoria nos traz ao conhecimento de tantas coisas que às vezes nos passam despercebidas. Com seu gesto singelo nos faz entender como é simples sermos irmãos unidos em Jesus, acolhendo os mais necessitados, os excluídos, os doentes, os jovens sem direção a seguir, os idosos às vezes tão esquecidos,e tantos outros, que mesmo as vezes sem nenhuma necessidade aparente, precisa tanto de um abraço fraterno, uma palavra de carinho e estimulo para seguir adiante; coisas simples que hoje muito pouca gente tem tempo para ofertar e doar..
    Obrigado Pde.Julio, com o sr. tenho a felicidade de aprender sempre, um pouco a cada dia. Seu texto hoje sobre os santos mencionados nos fez conhecê-los.
    É uma honra tê-lo como paróco da nossa comunidade, e mais ainda, que podemos fazer parte dela com o sr.
    Que Deus o abençõe sempre!!
    Sarah